Fernanda Palma é professora de Direito e escreve
regularmente no "Correio da Manhã". Habitualmente, aprecio os seus textos
claros, esclarecidos, esclarecedores e desapaixonados porque objectivos.
Hoje, a respeito do número de mandatos autárquicos, escreve assim:
[...] Tendo em
conta a razão de ser da lei, é possível sustentar que a limitação à renovação
de mandatos se estende a outras autarquias (municípios ou freguesias,
conforme o caso). Tratar-se-ia de
impedir a perpetuação de certos circuitos negociais e de rotinas
antidemocráticas, que são fáceis de transpor territorialmente, sobretudo num
país pequeno.
Mas é plenamente
viável uma interpretação mais restritiva da lei, que conclua que só se pretende
evitar a eternização de um presidente numa certa autarquia. Esta interpretação
pode invocar a letra do artigo 118º da Constituição, que admite limites à
"renovação de mandatos", e a natureza restritiva (de um direito
fundamental) da lei que limita essa renovação. [...]
Para um leigo, o primeiro parágrafo transcrito parece arrasador
e claramente o espírito da lei. Não sei se é, mas numa terra chamada Portugal, devia
ser. Todos sabem que contempla uma realidade de todos conhecida e não vale a
pena, por pudor, hipocrisia, ou pela preocupação com o "politicamente
correcto", estarmos a enganar a população e a enganar-nos. São conhecidas práticas
ilegítimas no chamado poder local—pontuais umas vezes, outras não tanto assim—e
a melhor maneira de evitar que se perpetuem é legislar de forma genérica. Sem
querer insinuar nada com o exemplo, é claríssimo que os "circuitos negociais e de rotinas
antidemocráticas" são facilmente trasladados de Sintra para Lisboa,
de Gaia para o Porto, da Amadora para Loures e por aí fora. Não sejamos parvos,
por favor. Calar é consentir.
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