domingo, 4 de maio de 2014

VALORES DE ABRIL

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Não há dia em que não se ouça falar—de manhã, à tarde e à noite—dos valores de Abril. E muito bem, como diria o Dr. Soares. Só que ninguém explica o que é essa coisa dos valores de Abril; ou se explica, explica mal, porque há várias teorias.
Depois de fazer a revisão cuidada da matéria, fiquei com dúvidas ainda assim. Eram os valores de Abril o programa do Partido Comunista, que esteve quase a montar o cavalo do poder? A montar o cavalo do poder? Que digo eu? Que montou o cavalo do poder e foi depois apeado no 25 de Novembro. A ser assim, os valores de Abril foram atraiçoados, sim senhora e senhor.
Ou eram os valores de Abril as prisões arbitrárias feitas por populares de extremíssima esquerda apoiados por militares do MFA, verbi gratia Otelo Saraiva de Carvalho, comandante do COPCON? Ou as ocupações selvagens de propriedade privada, feitas por populares de extremíssima esquerda apoiados rebabá? Ou os saneamentos "à Saramago", nos jornais, nos hospitais, nos quarteis e em todo o lado onde havia "fassistas"? Ou rebabá? A ser assim, os valores de Abril foram atraiçoados, sim senhora e senhor.
Ou eram as gestões ruinosas de sucessivos governos constitucionais que, de tombo em tombo, com três declarações de falência em menos de 40 anos (duas pela mão do Dr. Soares), nos meteram neste fundo de saco em que estamos? Se eram, então a corrida em pêlo do Zezito foi uma traição aos valores de Abril, sim senhora e senhor. 
Ou eram uma Justiça de carregar pela boca que deixava fugir os grandes corruptos e punia quem fazia a rifa de um bacalhau, com bilhetes a um euro, para angariar fundos para a festa da santa, devoção da terra? Se eram, então os valores de Abril não estão atraiçoados porque a Justiça continua exactamente nessa situação, imaculadamente igual e rasca.
O Dr. Soares se me conhecesse—felizmente, não conhece—, diria que também sou fascista; na melhor das hipóteses neo-liberal, defensor do capital usurário, ou coisa ainda pior: advogado da austeridade—que mata, como disse muito bem o Papa Francisco, acrescentaria. Não fosse esse o caso, e tivesse eu acesso ao pensamento mais profundo do Senador candidato ao Panteão Nacional, tomaria a liberdade de lhe pedir para me explicar melhor o que é essa coisa dos valores de Abril. Assim de repente, só me ocorrem os almoços de cozido à portuguesa comidos pelo coronel Vasco Lourenço no restaurante da Associação 25 de Abril, mas esses não estão em falta. Nesse aspecto, nem percebo porque o coronel se queixa—tenho a certeza que não os comia no 25 de Abril de 1974 e agora come. Nota-se nas bochecha e não só.
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