[…] Antero resumiu, com desusado brilho, o tipo do académico revolucionário e racionalista: e daí começou a sua popularidade - e a sua lenda. Não recordo, nem sei se é histórica, essa temerária noite, em que ele, durante uma trovoada, e de relógio na mão, intimou Deus a que o partisse com um raio, dentro de sete minutos, no caso de existir. Desconfio do altivo episódio. Antero não tinha relógio; a sua exegese era já muito fina para assim confundir as maneiras de Jeová com as de Júpiter: - e, se lançou o desafio satânico, foi rindo alegremente do excesso da sua fantasia. Mas é certo que ele se afirmou sempre como o grão-capitão das nossas revoltas, desde aquela que derrubou o bom tirano Basílio, até à que nos levou para o Porto, uma noite, entre archotes, ganindo a «Marselhesa». Todos os «Manifestos ao País», que a tradição nos impunha no começo destas sedições, saiam da pena de Antero: - porque já ele era, além da melhor ideia da Academia, o seu melhor verbo. […]
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Eça de Queirós in "Vida de Antero de Quental"
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