sábado, 15 de janeiro de 2011

DRAMA EM FORMA DE ESCÁRNIO

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[…] Depois do sucesso da colocação directa de mil milhões de dívida na sexta-feira (mas pagando mais caro que nos mercados), tivemos na terça-feira o sucesso de ficar com um défice em 2010 abaixo de 7,3% (mas só por causa do fundo de pensões da PT) e na quarta-feira o sucesso da emissão de dívida pública (mas a um preço ruinoso, como lhe chamou Krugman). Três sucessos que, contudo, só valem porque a Europa está a ajudar, por enquanto, através do Banco Central Europeu. […]

[…] Portugal tem tolerância zero. É por isso que José Sócrates anda a percorrer o mundo com uma “valise en carton”, ora vendendo t-shirts portuguesas, ora pedindo empréstimos a estrangeiros. […]

[…] Mas não chega. Portugal tem de ter uma agenda para o crescimento sustentado, como explicou há dias o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa. O problema financeiro regressará enquanto não resolvermos o problema económico: o crescimento. ”Reformas estruturais” não é um chavão – é uma chave. […]

[…] Com juros sempre altos e crescimento sempre baixo, a equação não cubica. E corremos o risco de entrar numa espiral negativa e o risco da execução orçamental passar da despesa para a receita: é o paradoxo dos processos de consolidação brutais como o que enfrentamos. A acção de política financeira corta despesa de forma abrupta, o que provoca recessão; com recessão, as estimativas de receitas fiscais não são cumpridas e o défice aumenta; a reacção é voltar a cortar despesa, o que volta a prejudicar a economia. É o que se está a passar na Grécia. É o que pode acontecer em Portugal.

É por tudo isto que já não dependemos de nós. O pedido de ajuda ao FMI será feito se e quando os actores europeus decidirem. Mesmo sem essa ajuda, estamos num percurso de juros altos e crescimentos baixos, o que provoca um definhamento vicioso. […]

[…] Neste momento, Portugal não tem escolhas, tem escolhos.
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Pedro Santos Guerreiro in "Diário Económico"
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O texto, de que se transcrevem passagens, não diz nada de novo: todos concordarão com ele porque é a evidência em letra de forma. Mas está escrito com acutilante estilo e humor. O drama também cabe num texto de escárnio.
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