domingo, 14 de novembro de 2010

COM A DEVIDA VÉNIA

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[...] Embora os inquéritos televisivos a populares costumem colher uns resmungos, a verdade é que, tirando os já desgraçados, não sei de gente tão convicta de que a desgraça é uma hipótese que, se os poderosos do Céu ou da Terra quiserem, nunca nos atingirá. É por essas e não por outras que a desgraça se prepara para nos atingir com particular violência. [...]


[...] Em Lisboa, (...), o incansável vereador Sá Fernandes apareceu orgulhoso a exibir contenção: nas festas que aí vêm, a capital apenas investirá 846 mil euros em luzinhas, contra o milhão de euros de 2009. Se se considerar o passivo municipal, que era de 2 mil milhões no final do ano passado, a decisão é brilhante em ambos os sentidos da palavra.


A história das luzes, comparativamente irrisória, demonstra de qualquer modo o raciocínio do Estado, local ou central, perante a falência a que chegou. Em vez de se sustentar 13 mil empresas, fundações e institutos públicos, sustentam-se apenas 12.961. Em vez de se construir uma linha de TGV completa, constroem-se dois ou três pedaços de linha. Em vez de se alimentar os negócios de inúmeros amigos, alimentam-se os negócios de inúmeros amigos excepto o daquele que até se portou com ingratidão. [...]


[...] Se perguntam a Manuel Alegre pelo Orçamento, ele responde que o grave é que Cavaco Silva não se pronuncie a respeito. Se perguntam a Manuel Alegre pelos juros da dívida pública, ele responde que o grave é que Cavaco Silva não tome uma posição. Se perguntam a Manuel Alegre pelas horas, ele responde que o grave é Cavaco Silva não usar relógio a pilhas. O grave, digo eu, é semelhante deserto opinativo ser candidato à presidência da República. É verdade que, numa rara aceitação dos seus limites, ele já avisou que um mandato basta para fazer o que quer. Acho que bastaria um dia.
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Alberto Gonçalves in "Diário de Notícias"
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