domingo, 19 de junho de 2011

PROSAS ESCOLHIDAS

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De todos os espectáculos, que a indústria humana tem dado ao mundo nenhum mais admirável do que a navegação. Entes fracos e mortais filhos da terra ousaram transportar-se sobre elemento inestável e perigoso, levantar edifícios em cima das águas, dominar os ventos, e voar às extremidades do mundo por baixo de Céus desconhecidos.
Mas qual é a sorte do homem? Dotado de coração tão perverso, quanto o espírito é grande; o crime assenta-se ao lado do génio. De todas as invenções sublimes têm os homens abusado. Dos vegetais extraíram venenos: do ouro a moeda que tudo corrompe. As artes serviram-lhe para multiplicarem os meios de se destruírem. A navegação é, sobre tudo, origem de mortandades; o mar tornou-se campo de carnagem; e as ondas foram ensanguentadas pela guerra.
As duas partes do globo Oriente, e Ocidente, terra e mar, são igualmente o teatro das desgraças e crimes do homem: com a diferença, que dilatando as vistas e passos ao longo do continente, descobrimos ruínas e despojos do ferro e fogo; campos e ermos incultos; porém o mar sendo túmulo de grande parte da humanidade, nenhum vestígio oferece de tantos estragos. Todos os dias passa o navegador com despejo por cima das ondas, que têm engolido milhares de homens. [...]

José Inácio Andrade in “Memória dos Feitos Macaenses Contra os Piratas da China"  (1835)
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