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quinta-feira, 30 de abril de 2015
PARA LER COM OS DEDOS NO NARIZ
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No "Observador" de hoje, lê-se um notícia que começa assim:
O ex-diretor geral da Administração de Infraestruturas
e Equipamentos (DGIE), do Ministério da Administração Interna (MAI), já foi
formalmente acusado pelo Ministério Público. João Alberto Correia é um dos 12
arguidos num processo por crimes de corrupção passiva corrupção ativa e
passiva, participação económica em negócio, branqueamento, abuso de poder e
falsificação de documento na “adjudicação de obras efetuadas em estruturas da
responsabilidade do MAI”, informou esta quinta-feira a Procuradoria Geral da
República. Os arguidos terão lesado o Estado em mais que 900 mil euros. [...]
Curiosamente, faz amanhã um ano
que publiquei aqui, n' "O Dolicocéfalo", um post sobre João AlbertoCorreia; e no "Textos do Dolicocéfalo" transcrevi um artigo de Paulo Pena que rezava assim:
João Alberto Correia é arquitecto, maçon,
professor e influente nos corredores da política governativa. O seu pai também
era. Também ele se chamava João. João Rosado Correia, o pai, que morreu em
2002, foi ministro do Equipamento Social do bloco central sob a liderança de
Mário Soares. E também viu o seu nome envolvido num escândalo. A 15 de Agosto
de 1987, dois anos após a sua saída do Governo, a sua foto aparecia na primeira
página do Expresso: “Ex-ministro trouxe dinheiros de Macau para o PS”. Rosado
Correia, revelava o Expresso, estava no aeroporto de Hong Kong quando foi
interceptado por António Vitorino, à época governante em Macau, que o intimou a
devolver três milhões de patacas (300 mil euros) que tinha em seu poder. A
partir daqui as versões divergem. Fonte próxima de Vitorino, citada pelo
Expresso, garantia que o dinheiro provinha de uma “extorsão” sobre empresários
macaenses.
Rosado Correia dizia que o dinheiro era fruto
de uma “colecta de fundos” de que fora encarregado pelo PS. E acusava Vitorino,
indirectamente, por ter impedido o dinheiro de chegar ao partido, na altura
presidido por Vítor Constâncio. Duas versões opostas e nunca esclarecidas. Até
porque o caso nunca foi alvo de nenhuma acusação. E João, pai, escapou a uma
acusação. Mas não voltaria à ribalta política.
João Alberto Correia, o filho, também
frequentou o Terreiro do Paço, mas apenas como director-geral de
Infra-Estruturas e Equipamentos do Ministério da Administração Interna. Também
ele acabou por sair, entre suspeitas.
Mas não se ficam por aqui as
coincidências. Nos nomes, nos episódios, na formação em arquitectura, no berço
alentejano, na militância socialista. E em algo mais misterioso.
João, pai, foi grão-mestre do Grande Oriente
Lusitano, o maior ramo maçónico português. O filho é membro de uma loja com
peso histórico, a 25 de Abril. A sua nomeação para o Ministério da
Administração Interna deve-se a outro maçon, também do GOL, Rui Pereira, na
altura ministro, que se orgulhava, numa entrevista à SIC, de nunca ter sido
“proposto ou nomeado para nenhum cargo por um maçom”.
A maçonaria é um ponto central na vida de João,
filho. Integrou o Conselho Editorial da Revista de Segurança e Defesa, tal como
consta do seu currículo, com um restrito grupo de maçons influentes, como
Ângelo Correia e o próprio António Vitorino, que há 18 anos acusara o seu pai.
Mas o ex-libris da família é a Fundação
Convento da Orada, fundada em 1988 — pouco depois do escândalo de Macau — por
João, pai, e presidida entre 2006 e 2008 por João, filho. Com sede em Monsaraz,
a fundação detém uma universidade, a Escola Superior Gallaecia, que funciona em
Vila Nova de Cerveira, e onde João, e vários familiares, integram o corpo
docente.
João Alberto Correia tem 49 anos, e é o mais
velho de seis irmãos. É doutorado em arquitectura pela Universidade de Salford, Reino
Unido. Ao contrário do pai, não assina com o título Professor Doutor
Arquitecto. Mas tem interesses muito variados, que não se resumem à
arquitectura.
Foi adjunto de Conde
Rodrigues, quando este ocupou a secretaria de Estado da Justiça. Integrou a
Associação dos Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária. Ganhou um
concurso — também ele polémico — a que mais ninguém concorreu, quando João
Soares era presidente da Câmara de Lisboa. Graças a ele ficou com a concessão
do conhecido restaurante Eleven, no Parque Eduardo VII, que projectou e vendeu
a José Miguel Júdice e alguns amigos. O seu currículo encheu uma página do
Diário da República. Mas as suspeitas que sobre si recaem prometem encher
muitas mais, noutros periódicos.
Paulo Pena, com J.A.C
Já podem tirar os dedos do nariz, mas é aconselhável abrir a janela para renovar o ar.
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FAZ O HÁBITO O MONGE ?
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A roupa clássica e formal
muda o modo como se vê o mundo e condiciona o pensamento e comportamento. A
afirmação não é gratuita, nem a inventei—é de Abraham Rutchick, professor de
Psicologia na Universidade da Califórnia, baseada em estudos experimentais. O
vestuário clássico dá às pessoas "vistas largas", ou pensamento
holístico, em contraste com a roupa informal, que "afunila" o
espírito e concentra o raciocínio em pormenores. Em linguagem técnica,
significa que um fato clássico melhora o processamento abstrato com maior
eficácia que o concreto.
Nas experiências realizadas,
constatou-se que o efeito do vestuários é surpreendentemente diferente em
situações inesperadas. Por exemplo, uma mesma bata branca tem efeito diferente
se quem a veste pensa que é de um médico ou de um pintor. E mais surpreendentemente
ainda é o facto do efeito do vestuário formal se verificar, quer se use de
forma esporádica—para ir a um casamento, por exemplo—ou diariamente no trabalho.
Diz quem sabe que o vestuário
é um símbolo de poder para o homem e ninguém espera que um símbolo dessa
natureza se esfume nos tempos mais próximos. O hábito faz o monge.
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Nota - Nos comentários do artigo onde consta a informação resumida
em cima (pode ler aqui), um leitor chama a atenção para um ponto que parece
fazer sentido. Diz ele: o nosso vestuário também condiciona o modo como as outras
pessoas nos vêem, podendo ser um factor adicional a influenciar-nos.
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quarta-feira, 29 de abril de 2015
WHEN THE SONG DIES
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A conversa é sobre as canções
populares escocesas, memória de antigos lugares
e das pessoas que lá viveram. O filme traz de volta o encanto dos velhos tempos,
com evocação dos que partiram e suas tradições.
Não se preocupe se não
entender a conversa porque, com aquele accent e as dentaduras postiças, tende
para o impenetrável. As imagens e o som, contudo, são excelentes e chegam. (Para ver em ecrã inteiro)
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AINDA HÁ QUEM ADMIRE A TAP !
Os pilotos da TAP vão acabar com a empresa. Até que enfim!... Pena não terem acabado há mais tempo—aquilo é um cancro que, apesar de baixa malignidade, é mortal—leva muito tempo, mas causa sofrimento e acaba por matar. Por isso, do alto deste insignificante espaço, digo: MORRA A TAP, MORRA. PIM!
Já chega de chantagem com essa conversa "de bandeira" e da "lusofonia". Quanto à bandeira, é bandeira despregada nas benesses para os trabalhadores, à custa dos contribuintes. E quanto à lusofonia, é conversa de encher chouriços.
Dirão que os pilotos estão a prejudicar os outros trabalhadores da companhia. É verdade. Mas a pergunta é: o que têm feito esses trabalhadores para preservar a empresa? Raspas. A única atitude que se lhes conhece é cavar o buraco, onde a TAP será inumada. Agora podem pegar novamente nas pás para deitar terra em cima dos restos mortais da agora moribunda e a curto prazo falecida companhia de bandeira (a meia-haste).
Só um país pelintra e parolo como Portugal tem escrúpulos em acabar com um monstro daqueles. Pelintra e parolo porque quer passar por mais rico que países ricos onde não se hesitou em acabar com essa da "bandeira", como a Suíça ou a Bélgica; e também porque vive deslumbrado com os aviões portugueses que aterram e se pavoneiam em Heathrow, Orly, ou Fiumicino—completa saloiada!
Ainda há quem não core quando diz admirar a TAP! Ainda há quem tenha dó da TAP! MORRA A TAP, MORRA. PIM!
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VIVEMOS NO REINO DOS MICRÓBIOS
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Ontem, escrevia eu sobre os terráqueos
humanos, convencidos de serem casos únicos no universo, verdadeira nata
cósmica. Se excluirmos o Homo sapiens, tudo o resto será lixo e não
conta, pensam. Em boa verdade, tal prosápia é uma bazófia infantil.
Recentemente, o National Research Council,
orgão operacional da National
Academy of Sciences dos Estados Unidos,
promoveu um encontro—The New Science Metagenomics—com
o sugestivo título "Microbes Run the World" (Os Micróbios Governam o Mundo). Tal e qual. E não é bitaite!
Desde 2003 que o genoma das bactérias é estudado em escala
nunca vista, revelando que proteínas podem sintetizar e, consequentemente, a
abundância de funções possíveis daí decorrentes. Tal metagenómica revolucionou
a microbiologia, com repercussões em toda a Biologia nas próximas décadas.
As bactérias constituem 80% de todo o bioma, ou "massa
viva" da Terra e, para se ter ideia do que isso significa, recorde-se
que um quinto duma colher de chá de água
do mar tem 1 milhão de bactérias e 10 milhões de vírus. Como diz Craig Venter—pioneiro
na investigação do genoma humano—quem não gosta de bactérias, está no planeta
errado.
As bactérias têm papel na manutenção do nível de oxigénio da
atmosfera e regulam várias funções do nosso corpo—o microbioma do intestino,
boca, pele e outros órgãos conta com 3 mil espécies de bactérias, totalizando 3
milhões de genes diferentes (uma célula das nossas "governa-se" com
18 mil).
Do ponto de vista da evolução darwiniana, são um caso
aparte. Enquanto nos seres pluricelulares a transmissão de genes mutantes, ou
modificados, só se faz de uma geração para a seguinte—de forma "vertical"—nas
bactérias pode fazer-se "horizontalmente"; isto é, um gene modificado
pode passar a outras bactérias da mesma geração, "horizontalmente", o
que significa efeito imediato da mutação num número significativo de seres.
As bactérias trocam generosamente genes entre elas, numa antecipação muito
antiga do que se faz hoje com os alimentos transgénicos, por exemplo. Em boa
verdade, caminhamos talvez para uma situação de pangenoma, ou genoma universal, fruto da
permuta—natural ou artificial—de genes. Está a natureza a fazer os genomas
homogéneos? Parece. Se é verdade, fá-lo "inspirada" nos micróbios. A ser assim, não há dúvida que "os micróbios governam o mundo ("Microbes
Run the World").
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terça-feira, 28 de abril de 2015
A FESTA ACABOU PÁ
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O texto publicado em baixo é uma carta à Directora do jornal "Público", publicada ontem.
Gostei e publico-a, com a devida vénia, porque mostra que ainda há quem saiba escrever e, sobretudo, com senso. Não sei se o autor é de esquerda ou direita, nem isso interessa. Interessa sim que é sensato.
Houve um tempo em que estivemos perto de construir um país novo, um Portugal diferente daquele que nos cercava e sufocava diariamente. Depois de 50 anos a viver iludidos e prisioneiros de uma realidade má, mesquinha, castradora, inglória e pobre, veio um tempo em que todos os sonhos eram possíveis. Um tempo em que um punhado de homens e mulheres nos serviram de bandeja, a todos nós, numa libertação única e festejada em todo o mundo, a possibilidade de um país novo. A maioria de nós nem queria acreditar. E fomos todos celebrar para a rua. De mãos dadas e sorrisos cúmplices. Uma festa como nunca se tinha visto. Os tempos eram difíceis, a Guerra Fria, as colónias que alguns não queriam perder, a pobreza que não desaparecia de um dia para o outro, as mortes deixadas pela guerra colonial, a reconciliação entre todos que era preciso fazer. Mas a sofreguidão foi mais forte do que o bom senso e a lucidez. Queria-se tudo novo já! Todos os direitos, prerrogativas e privilégios. Os governos, apesar da competência de quem os integrava, duravam meses. A política veio-se intrometer onde deveria haver somente solidariedade, bondade, justiça, equidade, compreensão, entreajuda. Com a política vieram os compromissos, os jogos de poder, as alianças oportunas, as cedências escusadas. E o povo foi sendo esquecido. E a festa acabou sem que um país novo estivesse diante de nós. E muitos ficaram tristes e desiludidos. E não houve força para teimar em que o velho país com os seus velhos hábitos não fosse devidamente enterrado. E assim se deitou por terra o esforço de todos os que, ao longo dos tempos, foram contribuindo para aquele dia de festa. E a festa acabou. Mas, por mais que todos os dias me sinta desiludido com o que leio ou vejo na imprensa, direi sempre, do fundo do coração (!), por respeito e homenagem aos homens e mulheres que souberam lutar por liberdade, pão, justiça e paz, direi sempre:
Viva o 25 de Abril!!
Pedro Carneiro
Ermesinde
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RETRATO DO RETRATO
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Jerónimos e Torre de Belém em fundo num retrato alegórico
do Marquês de Pombal—Louis van Loo, 1766
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NÃO ME FAÇAS CHORAR
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O Zezito, epistoleiro
contumaz, escreveu uma carta a António Campos hoje publicada no site da SIC Notícias. Li em diagonal—foi
mais na vertical, para ser franco—porque não possuo robustez física para mais, não
obstante os progressos do meu fitness,
graças ao competente apoio da personal
trainer do ginásio que frequento. Mesmo assim, chegou para poder avisar os
leitores do perigo que correm se facilitarem e lerem a peça toda, puro lixo
tóxico. Só um parágrafo me enterneceu. Reza assim:
[...] Este é, portanto, o verdadeiro facto novo: depois de tanta busca, de
tantas escutas, de tantos interrogatórios, depois até da resposta à carta
rogatória, a investigação não só não prova nada do que afirma, como provou
exactamente o contrário: que o dinheiro pertence a outro ou a outros, que não é
meu nem nunca foi e que não posso, nem alguma vez pude, dispor dele.
[...]
Óh égua: não posso, nem alguma vez pude, dispor dele.[...]
Esta agora!
É disso mesmo que a gente
se queixa: dispunha dele mais do que eu disponho do ar que respiro. Segundo as
escutas, era só telefonar ao amigo e mandar entregar um bocadinho daquilo que gosta
muito, se possível em cash, numa mala
ou em envelopes porque não confiava nos bancos. E não havia recibos ou papeis e não ficava nada registado—nem atrás da porta. Talvez numa pedra de gelo, penso
eu. E como a memória nos atraiçoa a todos, Zezito e amigo incluídos, nem um
nem outro se lembra quanto transitou naquela correnteza de malas e envelopes.
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ONDE ESTÁ O WALLY ?
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Os terráqueos não são maus tipos—em geral, claro!—mas, quanto
a bazófia, não há pachorra. Estão convencidos que são casos únicos no universo,
não por serem os maiores nabos (provavelmente são), mas porque se julgam a nata
cósmica. Já acreditaram que o universo andava à volta deles e acham-se uns
génios porque inventam línguas para se entenderem—além das línguas de bacalhau—e
fazem uns foguetinhos que mandam até pouco além de Plutão.
Mesmo que haja vida noutros astros, é diferente a vida tout court—tipo alforreca—e a vida
inteligente, ou seja, a vida deles—sentem-se muito superiores à alforreca e
isso lhes basta. Moram no centro da Criação, claro está, e têm uma missão, qual
é a de encontrar indígenas de outros planetas para os converter e civilizar,
ensinando-os a lavar os dentes, a cortar as unhas dos pés, a fumar charros e a
beber canecas de Guinness.
É claro que sempre houve desmancha-prazeres, outra das
simpáticas características do terráqueo, e um dia veio um tipo chamado
Copérnico dizer que eram eles que andavam à volta do Sol; e depois outro que a
Terra era um pequeno planeta dum minúsculo Sistema com uma estrela quase insignificante,
a viver na periferia duma galáxia de terceira ordem e por aí fora. Foi um banho
de água fria. Afinal, somos quase uma trampa cósmica, disse o terráqueo.
Quase???!!!... Ó amigo, uma trampa completa—não tens nada de especial, além do
Mourinho, digo-te eu.
Este planeta não é privilegiado coisa nenhuma, pois vive
regulado pelas leis naturais que regem todo o mundo, leis mais rigorosas que as
da Assembleia da República, apesar destas contemplarem a ética republicana. A
sanduíche de atum que se comeu ao almoço deu-nos volta à barriga não porque houvesse
um plano para nos prejudicar, ou porque batemos na avó, mas porque estava
marada e deu caganeira—mais nada. Se estiver marada, dá sempre caganeira, seja
ao terráqueo, seja ao marciano, a menos que este tenha intestino inox. Chama-se
a isto o princípio da mediocridade, nome que não abona muito o habitante do
geodo onde vivemos. O mundo consiste em coisas que obedecem a regras. Se
perguntamos porquê isto, ou porquê aquilo, a resposta é sempre a mesma: porque o
universo e as leis da natureza são assim—seja na Terra, onde habita o Homo sapiens; em Marte, onde era suposto
habitarem os marcianos, mas parece que não; em Saturno, onde há gente soturna;
e em Plutão lar dos plutocratas (ou plutanenses?).
Temos uma visão antropocêntrica do universo, mas devemos
baixar a bola e fazer jogo mais rasteiro. Os seres humanos insistem em razões
delirantes para as coisas, seja a morte de uma criança, um acidente aéreo, um
furacão até. Mas, na realidade, estão sujeitos às mesmas leis do grão de areia—nem
mais, nem menos: exactamente as mesmas. E repare que o grão de areia não é
nada.
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segunda-feira, 27 de abril de 2015
OPINIÃO
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P - Quando acabarão os
combustíveis fósseis?
R - Nunca acabarão
porque deixam de ser usados quando o preço da extracção de um barril de petróleo custar o preço de um
barril. Nesse momento, a indústria do petróleo financiará apenas a
indústria do petróleo e a sociedade terá que usar outras fontes de energia.
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O MAL É ANTROPOLÓGICO
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A propósito do agora
divulgado relatório "Uma Década para Portugal", apresentado pelo PS,
onde se vislumbra a tendência keynesiana de muito investimento do Estado para criar
mais emprego e pôr fim à austeridade, Villaverde Cabral escreve no "Observador":
[...] Ora, nada disso vai
acontecer, como não aconteceu antes da bancarrota, quando o único freio ao
desemprego era o aumento da dívida provocado pelo investimento estatal e os
empregos públicos! Nem o Estado irá ter dinheiro para isso nem a austeridade
vai terminar, se por austeridade se entender, como a maioria dos mortais
entende, viver com o rendimento que conseguirmos angariar.
Não concordo com a política
do actual Governo, como já aqui escrevi, pois não corta despesa onde
deve e só mete a faca—escandalosamente—onde a carne é pouca mas não tem osso. Contudo,
voltar ao esquema do endividamento socrático, é de loucos e é isso que se
receia no "Syriza Costaneira".
Enquanto a esquerda
socialista não entender, "como a maioria dos mortais entende", que
austeridade é "viver com o rendimento que conseguirmos angariar", não
há nada a fazer—o bem só dura até acabar o dinheiro dos outros. Já constatamos
isso três vezes em 40 anos, mas o povo continua a votar neles com a louvável e
heróica esperança de que, repetindo a burrice, eles aprendam. Não aprendem:
aquilo é genético e só uma mutação no epigenoma resolve—está escrito nas leis da natureza.
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SAI UM FILHO LOURO COM ORELHAS DE CAMURÇA
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O universo tem 13,7 mil milhões de anos; o Sol, o Sistema
Solar e a Terra cerca de 4,6 mil milhões, mais coisa menos coisa; a vida no
planeta perto de 4 mil milhões e o Homo
sapiens quase 200 mil anos. O Sol acabará—por falta de "gasolina"—daqui
a 6 mil milhões e a vida na Terra pouco antes (relativamente).
Chamo a atenção para o facto de que a jornada entre a primeira
célula viva e o Homo sapiens durou
menos de 4 mil milhões de anos e este tem pela frente, pelo menos, outro tanto de
esperança de vida—muito tempo!
Postas as coisas assim, a pergunta é: se entre as
primeiras células e o Homo sapiens
actual houve evolução contínua, vai essa evolução parar na "maravilha"
que julgamos ser agora, ou seremos no futuro uma maravilha ainda maior? (Temos mais
4 mil milhões de anos para mostrar o que valemos)
É uma grande pergunta esta e seria ainda maior se fosse
minha. Infelizmente, não—foi o professor de Cosmologia Martin Rees, Presidente
Emérito da Royal Society, astrophysics mastrer no Trinity College de Cambridge e autor do
livro "Our Final Century: The 50/50 Threat to Humanity's Survival", que a fez. Uma pena porque perdi a oportunidade de mandar o bitaite da minha
vida.
É bem provável que estejamos a menos de metade do que
evoluiremos até sumirmos. A evolução tecnológica faz parte integrante do
desenvolvimento do homem e não há meio de a parar. Basta pensar na fertilização
de óvulos humanos in vitro e das
"barrigas de aluguer", para prever o que aí vem. Na
Inglaterra foi oficialmente aprovada a lei que permite gerar seres humanos
filhos de três progenitores: o pai que dá o espermatozóide, a mãe que dá o
óvulo, e uma segunda mãe que dá o ADN mitocondrial. Isto—agora meio de evitar doenças genéticas—será muito em breve forma de fazer filhos por
encomenda: com olhos azuis talvez, cabelo encaracolado, nariz egípcio e...,
sabe-se lá, orelhas de camurça. O problema tem implicações biológicas e filosóficas, mas
sobretudo teológicas. Isto é, qual é o homem de que fala a Teologia: o constituído
pelos fósseis encontrados em Omo, na Etiópia, com quase 200 mil anos; nós,
cidadãos da Terceira República Lusitana, gerada no ventre do Dr. Soares; ou o Homo cosmologicus que aí vem, com
orelhas de camurça e nariz maior que o do Zezito?
O que dizem as Escrituras refere-se a que homem? Ao
actual, ao futuro, ou a todos? Se a todos, é difícil perceber como serão
julgados os que viveram antes das revelações dos profetas e os que têm, ou
terão, genoma manipulado pelos pais e configuram filhos de Deus enviesados. Acabei
de escrever a 452ª palavra deste texto e já ultrapassei o limite de pachorra dos
mais pacientes—por isso, calo-me. Até ao próximo. Haverá mais!
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domingo, 26 de abril de 2015
'MENU ENGINEERING'
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A lista de um restaurante como deve ser não é coisa fácil de elaborar. Se está a pensar que se põe do lado esquerdo o nome dos pratos, depois uma linha de pontos à frente de cada um e a seguir o preço do lado direito e está feita, está enganado porque não está feita; ou está mal feita. Tal e qual.
Já ouviu falar em consultores de restaurantes? Provavelmente já. Mas não sabe talvez que há alguns dedicados só à feitura das ementas. Para ter uma ideia, vou dar alguns pormenores que me explicaram, antes de me tornar também um especialista; mas só alguns porque a matéria é mais complicada que Mecânica Quântica.
Para começar, fique a saber que listas com muitos pratos é asneira. Criam o chamado paradoxo da escolha; ou seja, quanto mais há para escolher, mais difícil é escolher e isso faz ansiedade. Está a ver? Idealmente, não deve ir além de 7 pratos, mesmo tendo capacidade para servir mais de 70, diz Gregg Rapp, engenheiro de menus (há disso). O McDonald's começou com poucos e agora tem 140—as vendas desceram 11% no primeiro trimestre deste ano.
Já ouviu falar em consultores de restaurantes? Provavelmente já. Mas não sabe talvez que há alguns dedicados só à feitura das ementas. Para ter uma ideia, vou dar alguns pormenores que me explicaram, antes de me tornar também um especialista; mas só alguns porque a matéria é mais complicada que Mecânica Quântica.
Para começar, fique a saber que listas com muitos pratos é asneira. Criam o chamado paradoxo da escolha; ou seja, quanto mais há para escolher, mais difícil é escolher e isso faz ansiedade. Está a ver? Idealmente, não deve ir além de 7 pratos, mesmo tendo capacidade para servir mais de 70, diz Gregg Rapp, engenheiro de menus (há disso). O McDonald's começou com poucos e agora tem 140—as vendas desceram 11% no primeiro trimestre deste ano.
Depois é preciso usar fotografias boas, por exemplo para as saladas. Se não as puser lá, poucos se lembram delas e são coisa de grande rendimento. Mas não se pode abusar das fotografias: muitas é pior que péssimo.
Depois os preços. Nunca escrever qualquer símbolo que lembre dinheiro. Por exemplo, €10,00 é burrice! A comida não tem nada a ver com dinheiro: custa 09.99 e mais nada (nem dracmas, nem talentos, nem escudos, euros, ou piastras—09.99 simplesmente. E o preço não deve estar no fim de uma longa linha de pontos, do lado direito. Figura logo ao lado do nome do prato. Por exemplo: Cabrito assado no forno com batatinhas a murro, arroz branco agulha e grelos salteados com alho alentejano - 09.99. Assim mesmo, ainda que o alho seja galego. Se o preço está longe do prato, as pessoas percorrem a lista dos preços e então é que vão ver a que prato corresponde o preço mais baixo,ignorando os outros—não falha.
Aliás, falando ainda de preços, é bom começar com uma lagosta qualquer a 120 euros ou mais, que nem é preciso ter porque ninguém escolhe mas dá muito conforto a quem encontra abaixo pratos a 10, 15 ou 20 euros.
A seguir temos o canto superior direito da folha. É o local privilegiado para a publicidade nos jornais e revistas e para "embarretar" clientes nos restaurantes: tudo que é lixo caro deve ficar aí.
Finalmente, para terminar porque isto não é uma aula de Menu Engeneering (para isso cobro honorários), vem a conversa. A galinha não é galinha porque é galinha ou galo do campo, a couve é portuguesa mesmo que fale castelhano, e as batatas não são batatas porque são batatinhas. Exactamente! Outro dia explico mais.
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A COOPERAÇÃO NA EVOLUÇÃO
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Aprendemos com Charles Darwin que a nossa condição é
fruto duma luta interminável em que o forte vence o fraco e se reproduz,
enquanto os outros, em perigo, eventualmente desaparecem. Somos descendentes de antepassados que em tempos remotos se reproduziram com mais sucesso
que os seus competidores por serem mais fortes, ou mais aptos. É cruel a
natureza! Contudo, talvez seja mais correcto dizer que era cruel a natureza.
Não obstante os horrores a que ainda assistimos, com expoente em coisas como o
Estado Islâmico e o Boko Haram, chegámos a um estado da humanidade em que, em
grande parte do planeta, a evolução é condicionada não só pela competição, mas também pela cooperação,
mesmo altruísmo. Como diz Roger Highfield num ensaio intitulado The
Snuggle for Existence (não confundir com struggle), poucos se apercebem que um dos meios de subsistir—paradoxalmente—consiste,
não em "lutar contra", mas em "cooperar com", atitude assumida
feliz e inconscientemente na maior parte do mundo actual. Ir ao café de manhã
tomar um galão e comer uma torrada—é o exemplo de que se serve—é a nossa colaboração
para alimentar uma multidão em meia dúzia de nações, pelo menos.
A evolução de Darwin era fruto da mutação, que cria a
diversidade genética, e da selecção que escolhe os melhores genomas. Hoje, a
evolução humana é feita de mutação, de selecção e de cooperação, sendo muito
mais generosa para o homem, aparentemente. E digo aparentemente porque tal
generosidade criou outro problema: o desenvolvimento da agricultura, da
indústria e do comércio está a ameaçar conduzir à situação em que os recursos do planeta não chegam para
tanta gente; ou seja, o bem colectivo colide com o bem individual. É esse o
grande desafio do Homo sapiens, desafio
que não pode ser resolvido pela tecnologia. Inesperadamente, o problema só tem
solução no factor que o criou, a cooperação ela própria.
Acho que vamos lá—tenho
fé nisso, mesmo sem ser optimista.
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A imagem no cimo reproduz a pintura "O Bom Samaritano" do espanhol Tapiro y Baro.
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ENOLA GAY
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Este é o avião bombardeiro americano B-29, com o número
de série 44-86292, posteriormente baptizado pelo seu comandante, Coronel Paul
Tibbets, como "Enola Gay", nome da sua mãe, dona-de-casa na Flórida. Era um modelo bastante modificado do B-29, cujos
compartimentos de bombas haviam sido adaptados para levar só uma bomba de
urânio 235, com 4,5 toneladas, que havia custado 2 mil milhões de dólares—a "Little Boy". A
bomba foi lançada sobre Hiroxima às 08H15 no dia 6 de Agosto de 1945, matou 100 mil
almas no primeiro instante e acabou com a II Guerra Mundial.
Leia aqui um interessante artigo sobre este tema—em
português do Brasil—com muitas e boas fotografias.
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sábado, 25 de abril de 2015
ANESTESIA FINANCEIRA
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Nos Estados Unidos, entre
1980 e 2010, as compras per capita realizadas utilizando cartões de crédito
aumentaram 1.500%. Mas um estudo de 2009 mostra que dois terços dos americanos
não sabem como funcionam os cartões que usam. Em certos meios sociais, pessoas com
alguns bens pagam facilmente com o cartão o dobro do que pagariam se pagassem a
compra em dinheiro.
O cartão anestesia
financeiramente o comprador sem que ele se aperceba disso. Por exemplo, enquanto
o preço de um bem pago em cash fica registado na memória do comprador durante
algum tempo, o preço do mesmo bem pago com cartão "evapora-se" em horas,
mesmo minutos. E o facto de levar sem pagar nada no momento da compra é um
factor anestesiante a que nem os especialistas em gestão de cartões resistem.
Quanto maior é o limite do
crédito do cartão, maiores são as burrices do consumidor. Um limite alto faz
parecer a compra mais barata—não é indiferente que a compra custe mais de
metade do limite do crédito, ou custe "apenas" um décimo desse
limite, embora o valor seja sempre o mesmo.
O facto de ver numa
mercadoria a indicação que pode ser paga com cartão de crédito faz subir as
vendas significativamente, muitas vezes a pessoas que nem precisam daquilo. A
melhor solução é trazer o cartão embutido num bloco de gelo, dentro duma
carteira isotérmica e ter de esperar que descongele para pagar. Vai ver que dá
resultado!
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Nota—Em todo o mundo, os grupos mais sensíveis à anestesia financeira são, de longe, os partidos socialistas.
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CUIDADO COM O PÂNTANO !
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Leio—porque não tenho robustez física para ouvir—que Cavaco Silva terá dito na AR ser a
corrupção um dos maiores inimigos das sociedades democráticas, com efeitos
extremamente graves no relacionamento entre os cidadãos e o Estado. E, logo a
seguir explicou porquê: porque "cria a falsa ideia de que a generalidade
dos agentes políticos, ou dos altos dirigentes da administração, não
desempenham as suas funções de forma transparente e essa falsa percepção alimenta
os populismos e abre a porta à demagogia".
Perante isto, sinto-me
esmorecer porque logo ao lado lê-se que—segundo o Ministério Público—entre
Julho de 2007 e Fevereiro de 2008, Joaquim Barroca, um dos administradores do
Grupo Lena, terá transferido 15,8 milhões de euros de contas pessoais para uma
conta de Carlos Santos Silva na Suíça e que, ainda de acordo com a mesma fonte,
este dinheiro tinha como destinatário final José Sócrates e seria uma
contrapartida pelos concursos ganhos pelo Grupo, num total de 200 milhões de
euros, durante os mandatos do ex-primeiro ministro. E, noutra coluna do mesmo jornal, leio que
durante anos um quadro do Banco de Portugal terá passado informações a um grupo
de pessoas que tinha montado um esquema de lavagem de dinheiro proveniente do
tráfico de droga.
Hoje já não leio mais jornais portugueses para não ficar
com a "falsa ideia que a generalidade dos agentes políticos ou dos altos
dirigentes da administração não desempenham as suas funções de forma
transparente".
Sabem o que acho? Anda todo o mundo a brincar ao faz de
conta. É muito mais fácil brincar ao faz de conta que enfrentar a realidade e
chamar os bois pelos nomes, não vá o pântano engoli-los.
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sexta-feira, 24 de abril de 2015
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