[...] De raça oriental, teve sempre o amor do fausto, das pedrarias, dos ricos tecidos, da pompa; os seus romances transbordam de descrições de palácios, de festas perante as quais as mais ricas galas de Salomão são como desbotados cenários de teatro de feira; o seu estilo ressente-se deste gosto: é um sumptuoso estofo, com recamos de ouro, cravejado de jóias, cintilante e espesso, caindo em belas pregas ao comprido da ideia. O dinheiro, o ouro, preocuparam-no sempre, menos pela sua influência social que pelo mero esplendor da sua amontoação. Os seus heróis possuem fortunas tão prodigiosas que seriam impossíveis nas condições económicas do mundo moderno; Lotário, o famoso Lotário, querendo dar um presente de anos a uma senhora católica oferece-lhe uma catedral toda de mármore branco, que ele mandou construir e que dedicou à santa do nome dela; o seu custo excederia decerto dois mil contos fortes. Confessemos que é chique. Pois bem: presentes destes dava-os Lotário todos os dias. O banqueiro Sidónia, uma das mais curiosas criações de Lord Beaconsfield, querendo dar ao seu amigo Tancredo uma carta de crédito para os banqueiros da Síria redige-a deste modo: «Pague à vista ao portador tanto ouro quanto seria necessário para reconstruir os quatro leões de ouro maciço que ornavam a porta direita do Templo de Salomão. Também muito chique.
Estou certo que um dos grandes prazeres de Lord Beaconsfield era poder manejar os milhões de Inglaterra. Todos os seus ministérios custaram caudalosos rios de dinheiro; gastava o ouro como a água – e dava-se ao luxo de realizar por si, e à custa do seu país, as larguezas épicas do seu banqueiro Sidónia. Mesmo quando estava no poder, estava ainda no romance. [...]
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Eça de Queirós in "Cartas de Inglaterra
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