quarta-feira, 13 de julho de 2011

A HIPÓTESE SURPREENDENTE DE CRICK

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Numa colaboração para a “EDGE Foundation”, Vilayanur Ramachandran, director do “Center for Brain and Cognition” e professor de Psicologia na Universidade da Califórnia, responde à pergunta “Para si, qual é a ideia perigosa?”, subentendendo-se que se trata da ideia actual, pois as coisas passam-se em 2006. E diz Ramachandran: A ideia que pode ser perigosa, se verdadeira, é a chamada “hipótese surpreendente” de Francis Crick, ou seja, a noção de que a nossa consciência e sentido do eu se baseiam inteiramente na actividade de 100 mil milhões de bits dos neurónios que constituem o cérebro.
É uma ideia não tão chocante assim pois é hoje quase consensual. Mas as implicações filosóficas, éticas e morais é que nunca terão sido cabalmente avaliadas. É facto que a Ciência não tem parado de produzir noções com efeito semelhante. Primeiro, Copérnico destronou a ideia de que a Terra era o centro do mundo; depois Darwin desfez o mito do desenho directo do ser inteligente, reduzindo-nos à condição de parentes de macacos um nadinha mais inteligentes que os nossos primos; Freud ensinou que não seremos completamente livres na orientação do comportamento, provavelmente condicionado por razões e motivos de que não tomamos consciência; a descoberta do código genético com todas as consequências daí retiráveis, levou James Watson a dizer: “Só há moléculas. Tudo o resto é Sociologia”; e finalmente, veio a revolução da Neuro-Ciência, com a teoria dos nossos pensamentos e aspirações como subprodutos da actividade dos neurónios.
Ramachandran termina assim, comentando a ideia de Crick (neste caso, a ideia perigosa para ele): “Se tudo isto vos parece desumanização, vocês ainda não viram nada”.
É verdade, digo eu. Ao longo da História, o mundo intelectual teve ideias sobre si e sobre o universo condicionadas por factores culturais muito diversos, fossem do foro da Filosofia, da Sociologia, da Religião, ou outros. A pouco e pouco, foram tais ideias acometidas por investidas vindas do lado da Ciência que, numa primeira fase criaram rejeição e repúdio, para depois, perante a sua indiscutibilidade, obrigarem a revisões de conceitos a fim de os tornar harmonizáveis com o progresso do saber. Foi assim com Copérnico, com Darwin e com Freud. Com a decifração do código genético e com as descobertas da Neuro-Ciência, foi mais fácil: a tradição cultural vai ficando mais resignada com o progresso científico, e menos combativa. Espantosamente, ainda se discute a teoria da evolução da espécies, mas na prática não se encontra hostilidade contra as conclusões da análise do genoma, ou contra a indicação de uma área do encéfalo onde se desenrola especificamente determinada actividade mental, por exemplo. Nestas matérias já não há fósseis como os criacionistas, o que resulta do facto dos problemas surgirem em tempo de muito maior abertura intelectual e tolerância doutrinária e as posições irracionais não se enraizarem. É isso o progresso.
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