terça-feira, 29 de junho de 2010

CALOTES MONÁRQUICOS E REPUBLICANOS


O Jornal da Noite publica uma conta de despesa feita pelo presidente da república dos Estados Unidos, Abraão Lincoln, em um hotel de Albany. O ilustre democrata e as pessoas do seu séquito pagaram a soma de um conto e alguns mil reis por uma hospedagem de menos de vinte e quatro horas.
Este facto argumenta vivamente contra a opinião dos que acham as repúblicas mais baratas para os povos do que as monarquias.
Efectivamente vemos que, ao passo que o presidente da república da América do Norte faz um conto de reis de despesa em algumas horas em Albany e paga essa despesa, sua majestade o imperador da América do Sul dispende no Porto mil libras em quatro dias, e não as paga.
É indubitável pois que as monarquias são incomparavelmente mais baratas do que as repúblicas.
Deve-se porém observar que, sob este ponto de vista, o descrédito das democracias pródigas procede principalmente das estalagens exigentes. Porque está provado que sempre que um republicano em viagem pretende gastar tão pouco como um rei económico, os estalajadeiros fazem ao republicano o seguinte: sequestram-lhe a bagagem.
Parece-nos arriscado estabelecer entre os príncipes e os povos esta perigosa competência de quem há-de pagar menos em viagem. Pois que, realmente, desde que as testas coroadas chegaram ao ideal de se apoderarem das contas e não pagarem nada, os povos só poderão desbancar os reis se, não pagando igualmente nada, começarem a estabelecer este uso: depois de se apoderarem das contas, apoderarem-se igualmente—das pratas.
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Ramalho Ortigão in "As Farpas"
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