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VISITA REAL AO NORTE
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Quantas singularidades, nesta viagem, da parte das câmaras! Um pouco antes de Vila do Conde — na estrada, à passagem do Rei, erguia-se este ornato: um palanque — um palanque! — com um mestre-escola cercado dos seus discípulos, funcionando. Decoração inesperada! As escolas, até aqui, tinham sido quase tudo, desde enxovia até curral: só não tinham sido duas coisas — escolas, e arcos de buxo.
Mas ei-las, agora, substituindo galhardamente, nas estradas armadas em gala, a coluna de lona do tempo de D. João VI ! A câmara escolheu delicadamente a escola para enfeite: podia pôr ali uma filarmónica ou um mastro: preferiu a escola. A instrução torna-se festão de luxo; o ensino arma-se em quadro vivo! Que dizem os livros e os espíritos sentimentais, que a escola é civilização, é paz, é futuro, e tantas sonoras imaginações? A escola é ornato municipal, é arrebique de festa, para armar as ruas, enfeitar os largos em vésperas do S. João e nos aniversários da Carta.
É uma revelação, isto. A câmara tinha ali aquela escola; não lhe servia de nada; extinguia-se mesquinhamente a um canto, sob o lento bolor. Pois bem. Tira-se a escola da sua inércia, escova-se, arma-se sobre um palanque, põem-se os meninos em posições estudiosas, arranja-se o mestre com gravidade pedagógica, põe-se-lhe rapé novo no nariz, enverniza-se a palmatória, espera-se. Ao longe, na estrada a poeira enovela-se; é El-Rei; sentido! os trens rodam surdamente no macadame; já se vêem os bordados das fardas; ei-los! E, como se poderia erguer nos tambores e nas trompas o hino — ergue-se nas bocas estudiosas o B-a-ba. Eis o A B C hino municipal! No dia seguinte os festejos murcham; desfazem-se os arcos, despregam-se as luminárias, desarma-se a escola — e tudo, lamparinas, livros, ensino e ramos de loiro, volta a apodrecer nos sótãos da casa da câmara!
Achou-se, enfim, às escolas, um fim, um destino, uma utilidade: ornatos de gala. E esperemos que na próxima viagem de El-rei ao Norte, seguindo-se o exemplo inteligente de Vila do Conde — os jornais digam: «A estrada de Penafiel a Amarante estava brilhantemente adornada de escolas primárias: de espaço a espaço, sobressaíam, com lindo efeito, liceus: havia ideia de pôr no topo a Universidade — mas este notável estabelecimento científico — não chegou a tempo! »
Oh terra do nosso berço! . . .
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Eça de Queirós in “Uma Campanha Alegre”
Mas ei-las, agora, substituindo galhardamente, nas estradas armadas em gala, a coluna de lona do tempo de D. João VI ! A câmara escolheu delicadamente a escola para enfeite: podia pôr ali uma filarmónica ou um mastro: preferiu a escola. A instrução torna-se festão de luxo; o ensino arma-se em quadro vivo! Que dizem os livros e os espíritos sentimentais, que a escola é civilização, é paz, é futuro, e tantas sonoras imaginações? A escola é ornato municipal, é arrebique de festa, para armar as ruas, enfeitar os largos em vésperas do S. João e nos aniversários da Carta.
É uma revelação, isto. A câmara tinha ali aquela escola; não lhe servia de nada; extinguia-se mesquinhamente a um canto, sob o lento bolor. Pois bem. Tira-se a escola da sua inércia, escova-se, arma-se sobre um palanque, põem-se os meninos em posições estudiosas, arranja-se o mestre com gravidade pedagógica, põe-se-lhe rapé novo no nariz, enverniza-se a palmatória, espera-se. Ao longe, na estrada a poeira enovela-se; é El-Rei; sentido! os trens rodam surdamente no macadame; já se vêem os bordados das fardas; ei-los! E, como se poderia erguer nos tambores e nas trompas o hino — ergue-se nas bocas estudiosas o B-a-ba. Eis o A B C hino municipal! No dia seguinte os festejos murcham; desfazem-se os arcos, despregam-se as luminárias, desarma-se a escola — e tudo, lamparinas, livros, ensino e ramos de loiro, volta a apodrecer nos sótãos da casa da câmara!
Achou-se, enfim, às escolas, um fim, um destino, uma utilidade: ornatos de gala. E esperemos que na próxima viagem de El-rei ao Norte, seguindo-se o exemplo inteligente de Vila do Conde — os jornais digam: «A estrada de Penafiel a Amarante estava brilhantemente adornada de escolas primárias: de espaço a espaço, sobressaíam, com lindo efeito, liceus: havia ideia de pôr no topo a Universidade — mas este notável estabelecimento científico — não chegou a tempo! »
Oh terra do nosso berço! . . .
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Eça de Queirós in “Uma Campanha Alegre”
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