..
Em 1969, o biólogo Robert Paine criou o conceito de
espécies chave, mais precisamente usou pela primeira vez a expressão keystone
species, dado que escrevia em inglês. Paine havia estudado a fauna de zonas
entre marés, donde fazia a remoção, durante a maré baixa, das carnívoras estrelas do mar – Pisaster ochraceus. Uma das presas da estrela, os mexilhões, passaram a
multiplicar-se incontrolavelmente, tomando conta do meio. Desapareciam as
esponjas e, sem elas, não havia nudibrânquias. E as anémonas iam também porque
comem o que as estrelas desalojam do solo. Chegava-se então à fase de mexilhões,
mais mexilhões, e mais mexilhões. Isto é, não sendo a estrela um ser dominante
no meio, mantinha o equilíbrio ambiental, seguindo-se a sua eliminação dos caos
no habitat. Tal fenómeno foi posteriormente constatado noutros meios com outros
seres, tornando-se um dos muitos modelos da Ecologia.
Falo nisto porque o mecanismo do fenómeno da espécie
chave tem paralelo na Sociologia humana e é muito actual. Sabemos há algum
tempo que o homem passou a ser factor de importância primordial no
condicionamento da evolução biológica, como falávamos há dias, ao adquirir
capacidade de poluir o meio, de esgotar, pela caça e captura, alguns tipos de exemplares
de cada espécie, quando não toda a espécie, de forçar a mudança de hábitos
alimentares a mamíferos e peixes e por aí fora. Eliminem-se as doenças e
aumentem-se os recursos alimentares e ninguém vai parar o Homo sapiens –
coitadas das outras criaturas!
Mas o referido nem é o aspecto mais importante do Homo
sapiens/espécie chave. Tal aspecto é intra-humano e respeita a uma minoria da
espécie versus resto da humanidade. Estamos a falar do que chamaremos
consumidores chave, como os apreciadores de caviar, consumidores do
pretensamente afrodisíaco pénis de tigre, das coxas de rã, das barbatanas de
tubarão, blá, blá, blá. Minorias que dizimam alegremente espécies, com prejuízo
do resto do planeta.
Actualmente, uma em cada quatro espécies de mamíferos
está ameaçada de extinção por razões que têm a ver com alguns de nós. Desde o
Século XVI já desapareceram 75 espécies às mãos de minorias – foram os CONSUMIDORES
CHAVE! Mas há mais: há os recursos não vivos. 15% da população mundial, a viver
nos Estados Unidos, Europa, Austrália e Japão, consomem 33% mais recursos, como
os combustíveis fósseis e metais, e produzem 32 vezes mais poluição que os restantes 85% de
seres humanos. Nos Estados Unidos, 80% da água é consumida pelos agricultores por
má utilização. Se os israelitas tivessem necessidade de tal quantidade, morriam
todos à fome. Os agricultores americanos são consumidores chave de água e é
sobre eles que deve se feita pressão para racionalizar o consumo; não sobre o
consumidor doméstico que gasta proporcionalmente uma ninharia.
A cruzada ambiental tem de empenhar-se nestes dois
aspectos: proteger espécies chave, o que é incontestavelmente importante; mas
muito mais importante no contexto actual é eliminar essa erva daninha que é o
consumidor chave de que todos vestimos um pouco a pele.
...
Sem comentários:
Enviar um comentário