sábado, 7 de abril de 2012

SEMPRE DARWIN!


A selecção natural descrita por Darwin, a sobrevivência dos mais aptos, a evolução biológica e temas assim são matérias frequentemente referidas neste espaço. Explicam muito do que existe hoje na biosfera e permitem compreender fenómenos que, na ausência do seu conhecimento, seriam completos enigmas. São coisas da História? Estamos tranquilos porque não é coisa para nos afectar no curto período que é a vida de cada um? Puro engano! Nas nossas barbas, ocorrem fenómenos de selecção natural, de sobrevivência dos mais aptos e de evolução biológica que nos ameaçam e já matam muita gente todos os dias.
Estou a falar da resistência das bactérias aos antibióticos, fenómeno que ameaça a humanidade. Anualmente, morrem 25.000 europeus vítimas de infecções por agentes resistentes aos antibióticos e, no mundo, 650.000 almas sucumbem à tuberculose por bacilos multi-resistentes, metade das quais não teriam nenhuma solução mesmo nas mais sofisticadas condições de assistência médica. Caminha-se para a era negra pré-antibiótica e não falta muito para se morrer de uma infecção estreptocócica da garganta, ou de uma ferida traumática no joelho da criança que caiu a jogar futebol. E porquê?
Pois a resposta é a selecção natural. Os antibióticos são usados sem critério, seja no tratamento de doenças em que não têm indicação, como a gripe por exemplo; seja na prevenção de infecções, na maioria dos casos asininamente; ou em doses sub-terapêuticas que não afectam os micro-organismos; ou na pecuária, em verdadeiras “fábricas de proteína”, para evitar as infecções e engordar os bichos sem sobressaltos (administram-se mais antibióticos a animais saudáveis do que a animais doentes); blá, blá, blá.
Que resulta de tais práticas? As bactérias sensíveis morrem de facto. Mas, no meio da multidão que é a população microbiana duma infecção, há sempre alguma ou algumas estirpes que têm resistência natural ao antibiótico usado. Essas sobrevivem. E, sem a concorrência das que foram eliminadas, multiplicam-se muito bem – mesmo muito bem. E, se passam a outro hospedeiro - novo doente - aquele antibiótico vai-se revelar inoperante: está instalada a resistência por selecção natural.
Mas há outros mecanismos. Sobretudo quando a dose do medicamento é sub-terapêutica, a bactéria, ou algumas delas, têm oportunidade de modificar o metabolismo de forma a contornar o passo em que o antibiótico actua. E, conseguido isso, transmitem tão preciosa qualidade à descendência – quando surgiu a penicilina, as infecções estafilocócicas eram canja: com uma ou duas injecções para uma infeccção respiratória, por exemplo, viam-se desaparecer num relâmpago todas as pequenas pústulas que eventualmente existissem na pele. Reparem no que acontece hoje às pústulas, o que é fácil de fazer – acontece nada.

Dir-se-á que a solução é inovar permanentemente no fabrico dos antibióticos. Teoricamente é. Na prática a teoria é outra. As indústrias farmacêuticas não são instituições de caridade, está bem de ver. Devem-se-lhes enormes benefícios pelo investimento que fazem em inovação e investigação, é verdade. Ganham muito dinheiro, é verdade. Mas temos o direito de lhes pedir que suportem prejuízos, em nome do bem da humanidade? Talvez tenhamos. Mas elas, suspeito, acham que não – pontos de vista! O facto é que as indústrias farmacêuticas estatais nunca descobriram nada de jeito; isto é, sem lucro não há inspiração.
E porque falo de prejuízos nesta coisa dos antibióticos? Então, não custam eles um dinheirão que enche os bolsos dos farmacêuticos, das farmácias, e das indústrias a montante? Dos farmacêuticos e das farmácias não sei. Da indústria sei que é complicado, porque investem rios de dinheiro para desenvolver um antibiótico novo contra o estafilococo, ou contra o bacilo multi-resistente da tuberculose, colocam-no no mercado e, dentro de um ano ou coisa parecida, as bactérias desenvolveram resistência ao medicamento e o negócio vai por água abaixo – é muito mais tranquilo investir em tratamentos da diabetes, da hipertensão arterial, da disfunção eréctil e coisas assim.
Vamos apertar as grandes farmacêuticas! Apertem, sim, apertem. Mas não apertem muito. É que a indústria farmacêutica é a quinta do mundo, se considerarmos as finanças uma indústria, que será a quarta. Antes dela, só a dos automóveis, a das armas e a da energia, terceira, segunda e primeira, respectivamente. O camarada Fidel já apertou e não se deu muito bem com o aperto. 
O melhor é começar a não exigir o antibiótico ao médico por dá cá aquela palha, a não usar os antibióticos por iniciativa própria, a apertar com a agro-pecuária para acabar com essa coisa de dar antibióticos ao bichos saudáveis, e por aí fora. Apertemos aí que apertamos bem.
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