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Julian Savulescu é professor
de Ética em Oxford. Recentemente, publicou um ensaio que dá para pensar duas
vezes antes de adormecer. Tem o
título "Should a human-pig chimera be treated as a
person?". Começo por explicar o que é a human-pig
chimera de Savulescu, antes de falar das suas consequências éticas.
Como sabe, a mula — e o macho
— é um animal que resulta do cruzamento do burro com a égua. Tem património
genético, que determina as suas características morfológicas e funcionais,
parcialmente do burro e parcialmente da égua. É híbrido, ou uma "quimera
asno-cavalar", ou "asno-equina" — não sei bem como dizer. Agora suponha que é possível — e logo se falará se é possível
ou não — criar uma "quimera humano-porcina"!
Nos Estados Unidos estão a
fazer-se tais "quimeras" — é verdade!...
Pega-se numa célula da pele
de um homem ou mulher, tira-se-lhe o genoma do núcleo, edita-se (já explico o
que é editar neste caso), vai-se ao ovo instalado na barriga duma porca grávida,
e mete-se lá o genoma humano editado. É editado porque se fazem alterações de
modo a que esse genoma "só" vai comandar a formação de um órgão, seja
rim, pâncreas, fígado, rebabá, por uma técnica chamada CRISPR, que não
interessa agora esmiuçar.
Então, no fim da gravidez,
nasce um/a porquinho/a muito lindo/a, em tudo igual à sua mãezinha porquinha, mas
com rins de homem (ou mulher, isso não interessa agora). Os rins são
alimentados por artérias e sangue "porcalhão", fazem chichi "porcalhão",
mas são como se fossem do/a dador/a, humano/a do genoma. Se este precisar de
rins novos, é como substituir a roda do automóvel — não há rejeição porque,
em boa verdade, aqueles rins são dele/a e estão no porco ou na porca como a
roda sobressalente está na mala do seu carro.
Neste momento, o leitor é
capaz de achar isto formidável, quase tão formidável como acharia um receptor
dos rins porcinos. Mas espere lá: e a porca? Sim, a porca!... Aquela porca dadora
de rim que podia ter o seu genoma (cruzes canhoto) e é metade porca e metade homem
ou mulher. Mata-se? Não pode matar uma porca que é quase humana; e mais(!),
quase parente — irmã, ou filha, já nem sei porque me perdi no meio desta trapalhada.
Valham-me todos os santos —
que mais irá nos acontecer?.
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