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Um dos argumentos agora
usados para condenar a anexação da Crimeia pela Rússia é o de que se estão a
mudar fronteiras de Estados estabelecidas na sequência da Segunda Guerra Mundial.
Em boa verdade, a guerra acabou em 1945 e a Crimeia só pertence à Ucrânia desde
1954. Antes era terra da Rússia, desde 1783, quando o Império dos Czares a
anexou, após dez anos de luta com otomanos.
Em Janeiro de1954, era Nikita
Khrushchev Secretário-Geral do Partido Comunista da União Soviética, o
Presidium do Soviete Supremo autorizou a transferência da soberania da Crimeia
para a República Socialista Soviética da
Ucrânia, a partir de Fevereiro daquele ano. As razões da transferência da
soberania então invocadas pelas autoridades russas eram, no mínimo, frouxas. Falava-se em "acto nobre da Rússia na
comemoração dos 300 anos da reunificação da Rússia com a Ucrânia", da "proximidade
territorial entre a Ucrânia e a Crimeia",
das "relações económicas e culturais entre elas", rebabá—uma longa conversa de
encher chouriços.
Khrushchev, Sectretário-Geral
desde há 3 ou 4 meses, havia sido presidente do Partido Comunista da Ucrânia de
1930 a 1949. Tinha enfrentado forte resistência popular à aceitação da
soberania da URSS, envolvendo muita violência. Em meados dos anos 1950, ainda
ocorriam encontros armados de monta. Khrushchev precisava de acalmar o povão e
nada melhor que fazer-lhe uma oferta
chamada Crimeia. Da ideia à acção, foi um relâmpago. Nada como regimes ditatoriais
para resolver depressa e expeditamente os problemas. E assim se fez a vontade de Nikita. A decisão teve dupla
vantagem: por um lado era um gesto de "amizade" da URSS para acalmar
os ânimos; por outro, permitia infiltrar a Ucrânia com milhões de russos,
aumentando a influência destes no País. A mesma técnica já tinha sido usada nos
Países Bálticos, especialmente na Letónia e na Estónia.
Os russos alegam agora
que a "dádiva" da Crimeia à
Ucrânia foi ilegal. É difícil saber o que—num Estado como a URSS—era legal e
ilegal (eu suspeito que era tudo ilegal, mas quem sou eu para dizer tal coisa?).
A verdade é que a iniciativa correu os
trâmites previstos na "lei" soviética e o actual argumento não colhe.
Mas Putin é um sacana,
está mais que visto—aqui fica o registo. Como de vez em quando usa metáforas
genéticas para dar uma de cultura, digo dele que é geneticamente um velhaco. Só
pode: foi coronel do KGB—Ponto.
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