No dia 10 de Fevereiro de de 1853, o pequeno navio "Charles
Mallory" chegava ao porto de Honolulu, no Havai, depois de partir de S. Francisco
13 dias antes. Proeza de velocidade nunca vista, um recorde. O "Charles
Mallory" pertencia a uma geração de navios que utilizavam tecnologias novas,
de ponta, e era um espanto na época. Apenas uma sombra pairava sobre ele—trazia
hasteada a bandeira amarela indicativa de que havia doentes graves a bordo com
varíola.
Os habitantes locais nunca haviam contactado com a
infecção porque a demora da viagem para aquela terra fazia com que os eventuais
doentes embarcados morressem antes de lá chegar. Com o "Charles Mallory"
e o progresso, foram contagiados e transmitiram depois a doença ao resto do
Havai. Morreu metade da população do porto e um quinto da de todo o Havai até a
epidemia ser controlada em Janeiro de 1084. Já todos perceberam onde quero
chegar. O progresso mata.
Quer isto dizer que é mau? De forma nenhuma! Basta pensar
que do progresso resultou também a vacinação contra a mesma varíola e hoje a
doença está extinta, depois de vitimar milhões de seres humanos.
Mas é preciso estar consciente do problema e ter noção do
perigo que o progresso comporta. É conhecido o dito de que o computador é a
máquina capaz cometer em segundos
um erro que mil homens não conseguem fazer em meses ou anos.
A mais perigosa consequência da vulnerabilidade do
progresso é a nossa dependência dele. Por exemplo, é sabido que as chamadas
ejecções coronais do Sol—emissões de partículas de grande energia, em resultado
de tempestades magnéticas na coroa solar—afectam a Terra, sobretudo pela
interferência com comunicações, sistemas de navegação, distribuição e
transformação da electricidade e um ror de outras coisas. Felizmente e até
agora, o Homo sapiens tem podido bem
com elas, se excluirmos pequenos transtornos. Mas, em 1859, o astrónomo
britânico Richard Carrington
registou uma dessas ejecções gigante que, na época, não teve grandes consequências.
A repetir-se agora, seria trágica. Provavelmente, só para dar uma ideia,
provocaria a fusão dos núcleos de cobre dos transformadores, deixando o mundo
sem energia eléctrica. Um cenário apocalíptico assim podia levar 10 anos a
reparar, com um custo de milhões de milhões de dólares, só nos Estados Unidos.
Quer isto
dizer que construímos um mundo artificial confortável, mas sem a segurança que julgamos.
Em boa verdade, estamos quase como os habitantes de Honolulu quando o "Charles
Mallory" lá arribou em 1853 e não temos consciência disso. Uma espiga!
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