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Li hoje um artigo de
Stephen J. Pyne, professor na Universidade de Arizona e autor do livro
"Fire: Nature and Culture", que é uma peça deslumbrante. Por falta de
engenho e arte, nem tento sitetizá-lo para não o trair mais do que vou fazer a
seguir: traduzir algumas passagens. Traduttore traditore, eu sei, mas fica o mal que faço pelo bem que pretendo fazer. O
original pode ser lido aqui.
Dos antigos elementos, o
fogo é o mais diferente. A Terra, a Água e o Ar são substâncias. O Fogo é uma reacção—sintetiza compostos a partir de outros do ambiente envolvente e adquire
existência a partir desse contexto. Arde duma maneira na turfa, de outra no
capim ou no pinhal; é diferente na montanha e na planície; é rápido quando o
ar é seco e ventoso; e pode não arder de todo quando está enevoado. É um travesti,
ou shape-shifter.
Pelos fins do Século
XVIII, caiu do pedestal e iniciou uma carreira decadente, como capítulo
secundário da Química e da termodinâmica e preocupação para tecnologias
aplicadas, como a cultura florestal. Nunca mais teve integridade intelectual: foi
considerado derivado doutros princípios mais fundamentais. Quando, como fogo
aberto, começou a retirada da vida quotidiana, iniciou uma longa recessão na
vida das mentes.
A natureza fundamental do
fogo depende do mundo vivo. A vida criou o oxigénio que o fogo precisa e gerou
os combustíveis. A química do fogo é bioquímica. O fogo liberta a energia que a
fotossíntese juntou. Quando isso
acontece nas células, chamamos-lhe respiração. Quando acontece no mundo selvagem, chamamos-lhe fogo.
Alguns lugares ardem
rotineiramente; outros episodicamente; poucos só raramente. O ritmo básico é molhado/seco.
A paisagem tem de ser húmida bastante para produzir combustíveis e seca quanto baste
para permitir que eles ardam. A areia do deserto não arde porque nada lá cresce. As florestas tropicais também não ardem, a menos que vento seco dissipe a
humidade.
Os ecologistas falam do
fogo nos mesmos termos que falam doutros fenómenos catastróficos, como tufões e
tempestades de gelo. Faz mais sentido vê-lo como catalisador ecológico. Cheias
e ciclones podem ocorrer sem uma partícula de vida presente; o fogo não—literalmente,
brota dos hidrocarbonetos. Do mesma modo
que a atmosfera e a biosfera mudaram com a chegada do oxigénio, e a fauna e
flora esculpiram a biomassa em novas formas, também o fogo mudou, ganhando
novas espécies.
Então, uma criatura nova
chegou para mudar o equilíbrio a favor do fogo. Não sabemos quando os
hominínios adquiriram a capacidade de manipular o fogo, mas sabe-se que o Homo
erectus podia controlá-lo e, com o advento do Homo sapiens, os hominínios
podiam produzi-lo à vontade.
Conservamos o fogo como
nosso monopólio. Não o partilhamos com nenhuma outra espécie. Outras
criaturas sobem às árvores, cavam túneis no solo, ou caçam—nós fazemos o fogo. É a nossa assinatura ecológica.
Substituímos o gelo, com o qual pouco podíamos fazer, pelo
fogo, com o qual, aparentemente, podemos fazer tudo.
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