Alfred North Whitehead viveu na segunda metade do Século XIX e primeira do XX. Era matemático, filósofo, professor universitário, autor de vários livros sobre ciência pura e filosofia da ciência, e orientou a tese de doutoramento de Bertrand Russel, entre outros feitos. Serve isto para dizer que não era completamente tonto, como se demonstra, e é preciso fazê-lo antes de dizer o que Whitehead proclamou um belo dia, do alto da sua autoridade indiscutível — assim, tal e qual: "Toda a Filosofia é uma nota de rodapé nos escritos de Platão". É esta uma daquelas afirmações que encerra definitivamente qualquer discussão, até sobre futebol, diga-se em aparte.
Porque falo nisto? Porque acho Platão um género para que não há muita pachorra. Hoje, por exemplo, li que Platão tinha o raciocínio que descrevo já a seguir, em itálico.
Suponham um universo vazio, sem coisa alguma. É um facto
que tal universo era melhor que outro cheio de coisas onde reinasse o mal e a
miséria. Significa isto que a continuação do universo vazio era uma necessidade
ética que se devia manter. Mas podia existir outra necessidade ética em sentido
oposto — a substituição do vazio pelo universo bom, cheio de felicidade e
beleza. Esta exigência ética era bastante para criar o universo como existe.
A quem argumenta que o universo está longe de ser bom e
cheio de felicidade e beleza, respondem os defensores de Platão — porque os há!
— que essa é a visão parcial dum todo muito maior, onde as coisas são diferentes
das que conhecemos. E dão exemplos — o Museu do Louvre tem obras primas, como a
Mona Lisa, obras assim-assim, e até obras medíocres; e nós estamos focados
apenas na parte do "museu" do universo que conhecemos, onde as obras
são medíocres, mas dão valor ao resto. Que tal esta?
Woody Allen, em 2010, numa entrevista a um padre católico,
disse mais ou menos isto: A existência humana é uma coisa brutal para mim. Além
de brutal, não tem sentido — experiência agonizante, brutal e sem sentido, com
algumas delícias, charme e paz, mas isso são apenas pequenos oásis. Cada um faz
o que pode para aliviar a agonia da condição humana — uns com a religião,
outros com a corrida ao dinheiro, ou ao amor; eu faço filmes. Mas todos vamos para a sepultura duma forma sem sentido.
Allen é o neurótico de Manhattan, já se sabe, mas escreve
uma boa nota de rodapé para os escritos de Platão — sem dúvida!
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