Montaigne disse um dia: a idade diminui-nos de tal modo que quando a morte chega só leva metade, ou um quarto de nós. Montaigne tinha 59 anos quando morreu—era novo. A morte ouviu-o e apressou-se para aproveitar o possível; e ainda levou muito.
Lévi-Strauss, antropologista e intelectual francês, recordando as palavras de Montaigne, comentava que na idade dele sentia isso, porque existiam em si duas personagens: a real—um holograma actual já fanado—e outra, a que chamava metonímica, a do tempo do vigor intelectual. E que havia um diálogo entre as duas, em que a metonímica planeava, sonhava, tinha ambição, dizia para continuar, e a real que lhe respondia ser esse o papel dela porque só ela podia ver o todo. Em aparte curioso, digo que a morte se desleixou porque Lévi-Strauss morreu com 100 anos.
É tudo discutível, até o que não tem discussão.
Aparentemente, o tempo—ou idade—tira umas coisas ao cidadão e dá outras. Não
tenho, nem ninguém tem, qualquer dúvida sobre isso. O discutível é a avaliação dos
ganhos e perdas. É o que entra melhor ou pior do que o que sai? Montaigne
achava pior e Lévi-Strauss, aparentemente também. Tenho uma teoria!
Penso, ao contrário de Montaigne e Lévi-Strauss, que não
há dois segmentos na vida intelectual: há três—os dois de que falavam, mais o
terceiro, de nítida e confrangedora degradação, tão grave que nem temos consciência
dela. Nos duas primeiras etapas, provavelmente há quem perca com a idade e quem
ganhe com ela—não há regra geral. Na terceira é que a morte fica a perder,
porque leva pouca coisa. Acho que sim—muito pouco!
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