A mais errada ideia sobre ciência é que ela procura e encontra
a verdade. Tal coisa é uma utopia—a ciência constrói modelos de como o universo
funciona, tão próximos da realidade quanto possível, e depois vai limando, serrando,
colando, polindo, envernizando, restaurando e por aí fora, eternamente. Kepler
observou e explicou o movimento dos planetas; Newton melhorou o modelo de Kepler
com a teoria da gravitação; Einstein aperfeiçoou a teoria de Newton; alguém
há-de vir que limará a versão de Einstein, e rebabá. Ninguém perdeu,
ninguém ficou mal visto, se fossem vivos nenhum amuaria e todos juntos fariam uma
festa. Nem Kepler, nem Newton, estavam errados, mas o modelo de cada um podia
ser melhorado, e foi. Ciência não é polémica política ou religiosa, em que eu
estou certo e tu estás errado e a única coisa que temos em comum é a certeza da
infalibilidade.
Construir modelos científicos é uma actividade louvável e
quem o faz só espera alguém para ajudar a aperfeiçoá-los. Como as porcelanas
japonesas em cacos, referidas há dias aqui, valem mais depois de coladas porque, se o foram, é porque tinham valor e o trabalho da reparação é certificado dessa valia, os modelos científicos, se são aperfeiçoados, é porque
vale a pena pegar neles. Quem não gostaria de ser autor de um modelo corrigido depois por Einstein?
O curioso é que a construção de modelos não exige treino
ou vocação especial: faz parte da natureza do homem. A cambalear aprende-se a andar, a titubear aprendemos a falar. Passo
é marcha, balbucio é fala, modelo científico é verdade.
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