quinta-feira, 7 de junho de 2012

AQUILO A QUE SE TEM DIREITO

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[...] Pouco se fala nele, mas foi quem deu forma, tanto ao ultraliberalismo como ao minissocialismo. Refiro-me ao endividualismo, isto é, ao novo tipo de individualismo de massas que nas últimas décadas mudou todas as regras do jogo político. [...]


[...] O endividualismo representa o apogeu jubilatório do indivíduo que se realiza pelo crédito, isto é, pela dívida. Ele tornou-se, no mundo de hoje, no pilar mais generalizado - e talvez no mais resistente! - deste paradigma em crise. Ele decorre da afirmação sem limites dos direitos dos indivíduos, da progressiva identificação do direito com a proteção da esfera do privado e da rasura sem precedentes das referências a valores ou convicções de ordem coletiva. [...]

[...] O endividualismo foi contudo viabilizado e estimulado - ao contrário do que se diz e por mais paradoxal que tal pareça a muitos - pela poderosa afirmação de um Estado social que, libertando pela primeira vez na história os indivíduos da necessidade de terem de preparar o seu futuro e o dos seus (garantindo-lhes reformas, educação, saúde, etc.), o tornou um soberano cada vez mais centrado em si próprio. [...]

Quem escreveu isto? Informo desde já que não fui eu porque não tenho estudos para tanto. Saibam os incautos que me lêem, se não sabiam antes, que foi o Professor Manuel Maria Carrilho, ilustre militante socialista e ex-ministro de dois governos socialistas chefiados por António Guterres, expoente da defesa do Estado social, da realização do indivíduo pelo crédito, da afirmação sem limites dos direitos dos indivíduos. É verdade! No “Diário de Notícias” de hoje, escreve isto e ainda mais.
Asnear e reconhecer o fenómeno é manifestação de inteligência; inteligência insuficiente para evitar a asneação prévia, mas bastante para a identificar depois. E também acto de humilde contrição que se aprecia, quando não é assumpção insolente de que os outros são parvos.
Para quem tem um nanograma de senso, sempre foi evidente que o “ter aquilo a que se tem direito” é o caminho mais curto entre o estado de equilíbrio financeiro e a insolvência. Infelizmente, o cidadão comum tem pouca percepção do fenómeno, atenuante a considerar. Fomentar o Estado o endividualismo, para usar a expressão de Carrilho, é um crime político e social. Parafraseando Talleyrand, pior que um crime, é um erro estúpido. Tal e qual!

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