Além da dita
pobreza envergonhada, agora também temos, em menos numerosos mas mais notáveis
casos, a pobreza descarada. A de Paulo Campos, por exemplo. O ex-secretário de
Estado das Obras Públicas declarou em entrevista televisiva precisar do
patrocínio mensal dos pais para viver e criar os filhos. Este dilacerante drama
não traduz apenas a profunda crise económica do País: traduz sobretudo a crise
moral.
Depois de se ter
celebrizado pelo seu papel caridoso no Governo, tão caridoso que é alvo de estudos
(policiais, admita-se), o dr. Campos não recebeu um emprego, uma avença, uma
ajudinha que fosse. Depois de o dr. Campos plantar na administração dos CTT dois
antigos parceiros numa empresa criada exclusivamente inventada para fazer
negócios com uma autarquia, os parceiros e os CTT deixaram o benfeitor de mãos
a abanar. Depois de o dr. Campos contratar os "chips" de
identificação nas Scut a uma multinacional gerida em Portugal por um sujeito
que tivera a honra de ser seu assessor, o sujeito e a multinacional deixaram o
benfeitor de mãos a abanar. Depois de aliviar o contribuinte em 600 milhões que
reverteram para o grupo Ascendi (Mota-Engil e BES), o grupo e o contribuinte
deixaram o benfeitor de mãos a abanar. Etc.
Abanam as mãos do
dr. Campos e cai o queixo do entrevistador (José Gomes Ferreira), assombrado
perante tamanha falta de solidariedade. É este o Portugal que queremos? Um
lugar onde a generosidade é recompensada com desprezo e ingratidão? Um lugar
onde os altruístas sobrevivem a expensas paternas (e o salário de deputado)?
Aparentemente, sim, e é pena. Num país digno, ao menos o Estado teria a
decência de garantir o bem-estar do dr. Campos, zelando para que nunca lhe
faltasse alojamento, roupa, refeições regulares e visitas semanais da família,
entretanto aliviada de encargos.
.
Alberto Gonçalves in "Diário de Notícias!
,
Nota do editor—Não estou de acordo com Alberto Gonçalves quando, a terminar, fala em alojamento do Dr. Paulo Campos a expensas do Estado. O seu caso configura, com nitidez cristalina, o exemplo de um "afim", situação claramente do foro da Dr.ª Cândida Almeida, directora, pela Graça de Deus, do DCIAP.
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