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António Coutinho é presidente da
Sociedade de Ciências Médicas de Lisboa e foi director do Instituto Gulbenkian
de Ciência (1998-2012). No último número do jornal online "Observador", escreve um artigo
sobre transgénicos que vale a pena ler. Procurando não atraiçoar o seu pensamento,
transcrevo a seguir alguns trechos da referida peça que me parecem suficientes
para resumir a posição de Coutinho. (O artigo pode ser lido na íntegra aqui)
[...] A invenção da agricultura há uns 10.000 anos foi dos passos mais
críticos na história da humanidade, permitindo entre muitas outras coisas, a
sedentarização, a emergência das cidades e da cultura, da filosofia e da
ciência.[...]
[...] Se as primeiras espécies cultivadas parece terem resultado de
“acidentes genéticos” naturais, ao longo destes milénios os agricultores têm
vindo a proceder paciente e sistematicamente, ao “melhoramento” das espécies
cultivadas ou domesticadas, seleccionando plantas mais resistentes a pragas e
variações climáticas, que produzem mais e melhores frutos, sementes ou raízes,
ou seleccionando animais mais inclinados a co-habitar com o homem, que produzem
mais carne, gordura ou leite. [...]
[...] De resultados por vezes inesperados, o processo de melhoramento
genético das variedades domesticadas foi, sobretudo, um trabalho paciente e
lentíssimo, pois muitas gerações são habitualmente necessárias para “melhorar”
uma qualquer característica do animal ou planta seleccionados. [...]
[...] Nos últimos 20 ou 30 anos, com o progresso da genética molecular e da
fisiologia, tornou-se possível proceder ao melhoramento de espécies de maneira
totalmente controlada e racional, com resultados quase imediatos.
Por vezes, os dois tipos de interesses conjugam-se: a
resistência de plantas transgénicas a várias pragas e parasitas permite limitar
ou eliminar a utilização de pesticidas tóxicos, é “amiga do ambiente” e diminui
grandemente os custos de produção.
[...]
[...] Em resumo, hoje fazemos melhor, mais controladamente e, sobretudo,
muito mais depressa o que sempre fizemos na História. Donde a minha enorme
surpresa ao assistir à resistência de alguns ambientalistas contra os alimentos
“transgénicos”. Lobby muito poderoso e vocal, promotor frequente de arruaças, o
“movimento anti-transgénico” é fruto de uma total irracionalidade. [...]
[...] Não é verdade que os alimentos “transgénicos” fazem mal à saúde: não há
qualquer demonstração, nem mesmo qualquer resultado experimental ou
epidemiológico que sequer o indique (as raras “declarações” iniciais do
contrário foram, entretanto, sistematicamente desmentidas por observações mais
rigorosas e sérias). [...]
[...] Ou seja, sabemos fazer agora em poucos meses o que levava muitas
gerações a conseguir, usando o mesmo mecanismo genético. [...]
É claro para muita gente
esclarecida—digo eu—que as campanhas anti-transgénicos são fundamentalmente
inspiradas por motivos políticos da esquerda. Na realidade, o que se combate
são as empresas produtoras de transgénicos e não estes propriamente ditos.
Aceitamos que algumas dessas empresas não são organizações éticas de excelência;
mas isso não significa que a ideia, o método, o princípio e a produção dos
transgénicos não represente um enorme avanço da agricultura, capaz ajudar no
combate à fome e a doenças endémicas no mundo mais pobre, como pode acontecer
com o arroz dourado na prevenção da cegueira e de doenças infecto-contagiosas.
Em minha opinião, e como escreve António Coutinho, o movimento
anti-transgénico é fruto de uma total irracionalidade. Ou talvez não, se encarado
como arma anti-capitalismo.
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