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Desde logo, é preciso pensar que há factores históricos, afectivos,
estéticos, culturais, etários e por aí fora envolvidos no tipo de respostas
possíveis. Cada vez mais, há menos gente do tempo em que não existiam livros
electrónicos e isso modifica a perspectiva dominante da população. Um jovem que
não tem qualquer ligação sentimental ao livro em papel—para ele, igual a um rolo
de papiros para mim—está-se a borrifar para a beleza do livro, naturalmente. Na
melhor das hipóteses, considera-o bom para equilibrar uma perna da mesa da
cozinha, ou subir o assento da cadeira, embora péssimo pelo espaço que ocupa no
quarto, onde tem de pôr o skate, a bola, a flâmula do Benfica, a "taça da carica" e mais um par de botas. Sobretudo, acha-o um atraso de vida.
Mas nesta matéria, como em quase tudo, há que considerar uma coisa chamada ponto de vista. Imagine-se que o livro em papel só tinha sido inventado no ano
passado e não no Século XV. O que diriam as pessoas habituadas a ler, até
2014, apenas livros electrónicos? É difícil
responder, mas pode-se especular.
Por exemplo, que os livros em papel são muito baratos quando comparados com os aparelhos de
leitura de livros electrónicos e, embora se tenha de comprar muitos separadamente,
isso faz-se ao longo da vida, ou seja, em prestações suaves. E também que podem ser
lidos em qualquer lugar minimamente iluminado, sem necessidade de ligação à
Internet, inexistente ainda em muitos locais. E que podem ser emprestadom ao
amigo—até ao inimigo—sem correr o risco de grande prejuízo se se "esquecerem"
de os devolver. E que se cairem na banheira, depois de os colocar um
dia em cima do aquecimento do quarto, ainda os podem ler sem gastar mais dinheiro
a repará-los. E que, bem analisadas as coisas, cheiram a saber e a cultura. E que
são uma peça bem mais ornamental que aquele horrível Kindle que tem em cima da
mesa da sala ou de cabeceira. E que não precisam de bateria, nem dão problemas se
não tiver onde a carregar. E em que pode escrever notas nas margens das páginas,
para si e para a posteridade. E que ninguém vai implicar consigo, por causa de
um livro, na segurança do aeroporto, naquela cangalhada onde a pessoa tem de
tirar o casaco e às vezes até os sapatos. E que pode ler no avião desde o
minuto em que senta o rabo no banco da caixa voadora, até ao minuto em que se levanta quando chega ao
destino. Que grande invenção esta!!!—diria. Tenho a certeza; digo-lhe eu que só
leio livros no computador e tenho conta aberta no Kindle, veja lá. Sabe uma
coisa? Somos todos uns asnos!
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