Ontem, escrevia eu sobre os terráqueos
humanos, convencidos de serem casos únicos no universo, verdadeira nata
cósmica. Se excluirmos o Homo sapiens, tudo o resto será lixo e não
conta, pensam. Em boa verdade, tal prosápia é uma bazófia infantil.
Recentemente, o National Research Council,
orgão operacional da National
Academy of Sciences dos Estados Unidos,
promoveu um encontro—The New Science Metagenomics—com
o sugestivo título "Microbes Run the World" (Os Micróbios Governam o Mundo). Tal e qual. E não é bitaite!
Desde 2003 que o genoma das bactérias é estudado em escala
nunca vista, revelando que proteínas podem sintetizar e, consequentemente, a
abundância de funções possíveis daí decorrentes. Tal metagenómica revolucionou
a microbiologia, com repercussões em toda a Biologia nas próximas décadas.
As bactérias constituem 80% de todo o bioma, ou "massa
viva" da Terra e, para se ter ideia do que isso significa, recorde-se
que um quinto duma colher de chá de água
do mar tem 1 milhão de bactérias e 10 milhões de vírus. Como diz Craig Venter—pioneiro
na investigação do genoma humano—quem não gosta de bactérias, está no planeta
errado.
As bactérias têm papel na manutenção do nível de oxigénio da
atmosfera e regulam várias funções do nosso corpo—o microbioma do intestino,
boca, pele e outros órgãos conta com 3 mil espécies de bactérias, totalizando 3
milhões de genes diferentes (uma célula das nossas "governa-se" com
18 mil).
Do ponto de vista da evolução darwiniana, são um caso
aparte. Enquanto nos seres pluricelulares a transmissão de genes mutantes, ou
modificados, só se faz de uma geração para a seguinte—de forma "vertical"—nas
bactérias pode fazer-se "horizontalmente"; isto é, um gene modificado
pode passar a outras bactérias da mesma geração, "horizontalmente", o
que significa efeito imediato da mutação num número significativo de seres.
As bactérias trocam generosamente genes entre elas, numa antecipação muito
antiga do que se faz hoje com os alimentos transgénicos, por exemplo. Em boa
verdade, caminhamos talvez para uma situação de pangenoma, ou genoma universal, fruto da
permuta—natural ou artificial—de genes. Está a natureza a fazer os genomas
homogéneos? Parece. Se é verdade, fá-lo "inspirada" nos micróbios. A ser assim, não há dúvida que "os micróbios governam o mundo ("Microbes
Run the World").
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