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Os terráqueos não são maus tipos—em geral, claro!—mas, quanto
a bazófia, não há pachorra. Estão convencidos que são casos únicos no universo,
não por serem os maiores nabos (provavelmente são), mas porque se julgam a nata
cósmica. Já acreditaram que o universo andava à volta deles e acham-se uns
génios porque inventam línguas para se entenderem—além das línguas de bacalhau—e
fazem uns foguetinhos que mandam até pouco além de Plutão.
Mesmo que haja vida noutros astros, é diferente a vida tout court—tipo alforreca—e a vida
inteligente, ou seja, a vida deles—sentem-se muito superiores à alforreca e
isso lhes basta. Moram no centro da Criação, claro está, e têm uma missão, qual
é a de encontrar indígenas de outros planetas para os converter e civilizar,
ensinando-os a lavar os dentes, a cortar as unhas dos pés, a fumar charros e a
beber canecas de Guinness.
É claro que sempre houve desmancha-prazeres, outra das
simpáticas características do terráqueo, e um dia veio um tipo chamado
Copérnico dizer que eram eles que andavam à volta do Sol; e depois outro que a
Terra era um pequeno planeta dum minúsculo Sistema com uma estrela quase insignificante,
a viver na periferia duma galáxia de terceira ordem e por aí fora. Foi um banho
de água fria. Afinal, somos quase uma trampa cósmica, disse o terráqueo.
Quase???!!!... Ó amigo, uma trampa completa—não tens nada de especial, além do
Mourinho, digo-te eu.
Este planeta não é privilegiado coisa nenhuma, pois vive
regulado pelas leis naturais que regem todo o mundo, leis mais rigorosas que as
da Assembleia da República, apesar destas contemplarem a ética republicana. A
sanduíche de atum que se comeu ao almoço deu-nos volta à barriga não porque houvesse
um plano para nos prejudicar, ou porque batemos na avó, mas porque estava
marada e deu caganeira—mais nada. Se estiver marada, dá sempre caganeira, seja
ao terráqueo, seja ao marciano, a menos que este tenha intestino inox. Chama-se
a isto o princípio da mediocridade, nome que não abona muito o habitante do
geodo onde vivemos. O mundo consiste em coisas que obedecem a regras. Se
perguntamos porquê isto, ou porquê aquilo, a resposta é sempre a mesma: porque o
universo e as leis da natureza são assim—seja na Terra, onde habita o Homo sapiens; em Marte, onde era suposto
habitarem os marcianos, mas parece que não; em Saturno, onde há gente soturna;
e em Plutão lar dos plutocratas (ou plutanenses?).
Temos uma visão antropocêntrica do universo, mas devemos
baixar a bola e fazer jogo mais rasteiro. Os seres humanos insistem em razões
delirantes para as coisas, seja a morte de uma criança, um acidente aéreo, um
furacão até. Mas, na realidade, estão sujeitos às mesmas leis do grão de areia—nem
mais, nem menos: exactamente as mesmas. E repare que o grão de areia não é
nada.
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