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A Bíblia, texto base do
Cristianismo, é o livro mais lido e vendido no mundo. Cronologicamente dividido
em duas partes, o Antigo e o Novo Testamento, cada uma delas é composta pelos
chamados livros. O número de livros do Antigo Testamento varia com as religiões
e o do Novo Testamento é de 27. Um deles, o da Revelação, ou do Apocalipse,
sempre foi o mais popular e lido, apesar de ninguém o perceber muito bem e não
conter ensinamentos morais ou histórias sedutoras. Em boa verdade, é um horror,
com a descrição de visões, sonhos - ou pesadelos, melhor dizendo - prostitutas,
bestas, monstros, actos inqualificáveis e um ror de outras coisas completamente
delirantes. Não se entende como coisa assim, com mitos e histórias folclóricas,
não entrou ainda no simples domínio da literatura exótica e persiste num texto
religioso e sagrado.
O narrador, de que falaremos à
frente, é um tal João que se intitula profeta de Patmos porque terá sido em
Patmos, perto da actual Turquia, que escreveu o texto. Estava João de Patmos em
transe extático, quando ouviu uma voz vinda de uma figura angélica,
provavelmente Jesus, dizer-lhe “anda cá acima”; e a porta do Céu abriu-se. Subiu
ao Paraíso e viu o trono de Deus. E quando os anjos sopraram as trombetas,
avançaram os quatro cavaleiros do apocalipse, dos quais o segundo com a espada
da angústia e da fome, o terceiro com a da matança, e o quarto, da catástrofe e
violência. Mas, antes da acção começar, João viu uma mulher vestida com o Sol,
“enormemente” grávida, contorcendo-se na agonia do parto da criança que ia ser
o Messias e, em frente dela, um dragão vermelho e brilhante espera para devorar
a criança quando nasça. A mulher escapa e a criança vai para o Céu. O dragão
furioso é expulso do Paraíso e volta à Terra, onde se alia a um par de monstros
criados no princípio do tempo. Uma das bestas veio do mar. Tem sete cabeças e
coroas nas cabeças e faz a Terra e os seus habitantes adorar a besta. A segunda
é vermelha e brilhante e o seu número, diz João, é um número humano. O número
é, naturalmente, seiscentos e sessenta e seis.
A seguir, João volta ao Céu e vê
sete anjos com sete enormes bacias douradas cheias da ira de Deus. E, ao som
das trombetas, o primeiro anjo começa a derramar a ira de Deus sobre a Terra e
acontece a catástrofe.
E, neste estilo e tom, continua a
narração de João (não confundir com o apóstolo). Perguntar-se-á quem é este João,
que não é Spielberg. Presume-se que seria um profeta judeu que viveu no ano 90
do Século I. Mais precisamente, um refugiado expatriado, no rescaldo da guerra que
destruiu o seu País. Guerra que havia começado no ano 66, quando os judeus se
revoltaram contra os romanos. No ano 70, um exército de 60.000 romanos invadiu
Jerusalém e torturou, violou e matou milhares de judeus. Diz-se que o sangue
chegava ao freio dos cavalos. João põe o seu grito de revolta na boca das
personagens que diz ter visto no Paraíso: "Senhor, quanto tempo mais? Quanto,
até julgares as nações da Terra e vingares o nosso sangue?"
Esta é tese de Elaine Pagels, professora
de Religião na Universidade de Princeton e autora dos livros “The Gnostic Gospels; Beyond
Belief” e “Revelations”. Perante o choque que é a leitura do Livro do
Apocalipse, toda a explicação é bem-vinda. Esta, além de bem-vinda, é razoável
e tranquilizadora. Haja Deus!
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