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A linguagem é um instrumento indispensável à actividade
mental, seja esta criativa, de relação com os semelhantes, de investigação, e
por aí fora. Mas é indispensável estar consciente de que, como poderosa
arma do raciocínio, tem perigos. Por exemplo, quando se dá o nome a um
fenómeno em matéria científica, há de imediato tendência para o considerar familiar;
e, ainda pior, conhecido.
Veja-se essa coisa do conjunto de comportamentos a que sumariamente
chamamos instinto. Tem nome, toda a gente fala nele, sábios incluídos, e
ninguém sabe o que é. E como não se sabe, pode incluir disparates até. As
galinhas que, mal nascem, começam a actividade de “pica no chão”, mesmo quando
ainda nem têm o conhecimento empírico de que lá existe alimento: é o instinto,
diz-se, e está arrumada a matéria! Mas, provavelmente não é! Um investigador
chinês, depois de verificar que a vaselina quente pode tornar transparente a
casca dos ovos chocos sem prejudicar a sua viabilidade, observou com paciência
de chinês o desenvolvimento dos pintos. E viu que, para o galináceo em potência
caber no ovo, tem de dobrar o pescoço, colocando a cabeça sobre o tórax,
precisamente no local onde se desenvolve o coração pulsátil. Então a cabeça
adquire o ritmo dos batimentos cardíacos, num “pica no chão” perfeito que
continua depois do pinto sair da casca. O neófito não conhece o
movimento miraculosamente quando nasce: aprendeu-o no ovo!
E quando os doentes de Parkinson têm movimentos lentos,
os médicos dizem que sofrem de bradicinesia, encerrando a explicação. Mas bradicinesia
significa exactamente movimentos lentos e o termo, fazendo toilette, não
explica nada, nem serve para coisa nenhuma.
Mesmo com o mais inesperado, acontece isto. Gravidade, grande descoberta de Newton. É um termo do conhecimento
geral porque todos se apercebem do que é, ao sentir os seus efeitos, embora não
saibam muito bem como funciona. Isso é coisa para físicos, pensamos nós.
Pensamos, e pensamos mal, porque os físicos também não têm ideia clara do que é
a gravidade, nem sequer donde vem!
Isto é e em resumo, a linguagem tem alçapões; e muitos. Os de que falámos são apenas alguns: chamam-se falácias nominais. Ou podemos
chamar-lhes assim, com a reserva, como se viu, de que os nomes encerram riscos.
Os anglo-saxónicos chamam a isto the game of the name. Não é traduzível, porque
em português não rima. Mas é excelente!
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quarta-feira, 14 de março de 2012
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