quarta-feira, 18 de março de 2015

ORWELL E AS TÁGIDES

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Segundo consta, George Orwell terá escrito que quem não consegue escrever bem não consegue pensar bem, afirmação duplamente discutível porque i) é também atribuída a Oscar Wilde; e porque ii) aparecerá no ensaio  Politics and the English Language e ninguém a encontra lá. É possível que Orwell tenha dito ou escrito coisa parecida, mas diferente e noutro local, embora isso não interesse agora—interessa apenas a ideia porque tem sido objecto de controvérsia: escrever mal não implica pensar mal, constituindo a alegada afirmação de Orwell generalização abusiva.
Talvez se possa dizer que quem pensa bem não escreve necessariamente da mesma forma e pode até escrever mal, embora tenha condição para o fazer melhor.
E o que pensa mal? É bom candidato a ser mau escritor, embora andem por aí asnos com fama de escrever bem. É o domínio da forma sobre o conteúdo que se encontra em proporções variáveis, dependendo do autor.
Sem insinuar que nenhum deles seja asno, diz-se, por exemplo, que Kant não valia metade de Nietzsche como escritor, embora valesse o dobro como filósofo.
A língua, no fundo, é simultaneamente instrumento de comunicação intelectual e instrumento artístico. Quando usada da última forma, pode tornar a ideia brilhante. Camões sabia-o:


                         E vós, Tágides minhas, pois criado
                         Tendes em mim um novo engenho ardente,
                         Se sempre em verso humilde celebrado
                         Foi de mim vosso rio alegremente,
                         Dai-me agora um som alto e sublimado,
                         Um estilo grandíloquo e corrente,
                         Porque de vossas águas, Febo ordene
                         Que não tenham inveja às de Hipocrene.
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