A Edge Foundation, como referido ontem, põe anualmente uma pergunta a intelectuais e colige depois as respostas. A pergunta de 2007 era: Qual é a sua ideia optimista? E porquê?
Cento e cinquenta e sete respostas foram reunidas num livro, editado em Portugal pela “Tinta da China”, com o título Ideias Optimistas. É uma colectânea de vários textos de qualidade, mas hoje li um a que não posso deixar de fazer referência. Com passagens polémicas – para alguns - vale a pena pensar no que diz. O autor chama-se Daniel L. Everett e é investigador da cultura Pirahã (índios da Amazónia), e Director do Departamento de Línguas, Literaturas e Culturas e professor de Linguística e Antropologia na Universidade do Illinois.
Quase a abrir, diz esta coisa deliciosa: A suposta maldição da “Torre de Babel” – a diversidade de línguas e culturas – talvez seja a nossa maior esperança para continuarmos a ocupar de forma saudável a rocha que partilhamos neste universo impiedoso.
E mais adiante: Precisamos de abrigo, comida, companhia, afecto, sexo e oportunidades para desenvolvermos as nossas competências, entre outras coisas. [...] E, nomeadamente, precisamos de aprender a amar mais e a tolerar mais. Mas como é que aprendemos estas coisas? Onde podemos ir buscar as novas soluções para os problemas que ainda nos afectam? [...] Podemos aprender com os valores e as histórias de grupos mais pequenos e ignorados, dos quais temos registos, sobre como viver mais harmoniosamente no mundo.
Por exemplo, quando estudamos as extintas culturas dos índios Narragansett, contemporâneos dos primeiros colonos britânicos da costa Leste americana, aprendemos várias coisas sobre a tolerância perante a diferença. Quando em 1635 os líderes puritanos do Massachussetts expulsaram Roger Williams da sua colónia, certamente esperavam que Williams fizesse o que era certo e se deixasse congelar até à morte. [...] Contudo Wiliams foi acolhido pelos Nagarransett e passou o Inverno em segurança junto deles, aprendendo a sua língua e a sua filosofia de tolerância, da qual ele era prova viva. Os seus escritos acerca deste povo vieram a ter influência no pensamento de Thomas Jefferson, pelo que a filosofia Nagarranssett parece ter influenciado, ainda que de forma indirecta, as obras e o pensamento de William James, quando este desenvolvia o pragmatismo americano, talvez a única contribuição genuinamente americana para a filosofia mundial. [...]
Os 30 anos que passei a trabalhar com os Pirahã da floresta amazónica, por exemplo, ensinaram-me muito sobre a notável falta de preocupação que este povo revela em relação ao futuro ou ao passado e o prazer que retira de viver um dia de cada vez, sem receio de uma vida depois da morte, e na mais completa tolerância em relação às crenças dos outros. Os Pirahã sabem que as pessoas morrem, que sofrem, que a vida não é fácil, sabem que têm de lutar diariamente para arranjar comida para as suas famílias sem serem mordidos por cobras ou comidos por jaguares, sabem que têm de enterrar os seus jovens, vítimas de malária e de outras doenças. Mas nada disto afecta a sua alegria de viver, o seu amor pelo próximo ou a capacidade de contemplarem a morte sem medo nem a necessidade de imaginar um Paraíso onde possam continuar a vida terrena – para eles a única que existe.
A verdade religiosa é intolerante; é uma verdade que pratica a pregação ao mundo a fim de eliminar a diversidade das crenças. A história do Ocidente é a prova do resultado de tal atitude. Mas culturas como a dos Narrangassett, dos Pirahã, dos budistas zen e de muitos outros oferecem-nos alternativas à homogeneização e à destruição da diversidade do mundo. Mostram-nos que diferentes pessoas podem resolver os mesmos problemas do quotidiano, através de meios que previnem as consequências da violenta homogeneização que marcou a história ocidental.
O texto é longo e não posso alargar-me mais. Mas é uma chamada de atenção para o sentimento egocêntrico de superioridade de algumas culturas e para as consequências da tentativa de as impor aos outros. Em nome de tal princípio, causou a humanidade mais sofrimento e infelicidade ao próximo do que ele sofreria se o deixassem em paz a laborar no “erro”.
.
Para ler o original, clique aqui.
quinta-feira, 21 de janeiro de 2010
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário