Com espanto, leio na crónica de Anselmo Borges deste Sábado, no DN—logo a abrir—que o Papa Francisco encontrou uma Igreja em ruínas e daí o seu empenho, sem hesitações, de a transformar e converter. Não fico espantado por Borges o dizer, mas porque, sendo verdade, só agora ouço um sacerdote católico a falar assim.
Recordo que não
foi o Papa que antecedeu Francisco—Bento XVI—o responsável pela referida ruína. Bento XVI teve a percepção do que se
passava e da sua fragilidade para mudar o estado a que tudo tinha chegado,
resignando na esperança que alguém mais forte metesse a Igreja na ordem. O mal
vinha de muito antes, mas especialmente do papado de João Paulo II, verdadeira
calamidade na gestão duma Igreja que deixou entregue à Cúria, instituição nos
antípodas do espírito cristão. João Paulo II que—com surpresa—foi canonizado a velocidade meteórica, sem se perceber porquê tanta pressa—ou talvez sim por tal
ser fruto da pressão de gente dita católica mas pouco cristã.
Borges cita o teólogo Agenor Brighenti, quando escreve sobre
as mudanças que Francisco procura e fala da necessidade de passar de uma
Igreja-alfândega a uma Igreja samaritana; de uma Igreja de prestígio e poder a
uma Igreja pobre e para os pobres; da lepra do papado que são os narcisistas, adulados e exaltados pelos seus
cortesãos; de S. Bernardo quando lembrava ao Papa Eugénio III que era sucessor
de um pescador e não do imperador Constantino; da necessidade de substituir uma Igreja de prestígio e poder por uma Igreja
pobre e para os pobres; de superar o modelo centralizado de Igreja, a começar
pela Cúria, que urge reformar radicalmente, para ser organismo de ajuda e não
de censura; e de acabar com uma Igreja governada por bispos-príncipes e
transformá-la numa Igreja de pastores, que caminham com e no seu rebanho.
Francisco tem pela frente séculos de tradição católica
enviesada e não vai ter tarefa fácil porque o viés de tal tradição tem raízes
muito fundas numa comunidade predominantemente "beata" que ela
própria gerou em seu proveito e favor. Tenho conhecimento de comentários de
"beatos" que acham Francisco desbocado, inconveniente, irreverente e
politicamente incorrecto. Gente que não dispensa o cheiro do incenso, qual
Teodorico Raposão e a senhora sua tia.
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