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Tempos houve em que terão existido marcianos. Não falo de seres eucariotas e inteligentes como nós—passe a presunção—mas de procariotas, bactérias por exemplo. Nesse tempo Marte tinha atmosfera e estava envolvido numa confortável e espessa camada gasosa que o conservava "quentinho", com água no estado líquido e condições para suportar a vida. Talvez porque o impacto dum asteróide tenha fragmentado o planeta, reduzindo a sua gravidade, ou porque ventos solares a tenham impelido, essa atmosfera escapou-se gradualmente, o planeta arrefeceu, a água congelou e a vida desapareceu. Não existiram condições para a evolução conduzir a vida até qualquer coisa parecida com o Homo sapiens.
Nessa época não podíamos valer aos nossos irmãos marcianos pois éramos também micróbios. Mas hoje somos um espanto—veja-se o Nóvoa—e talvez pudéssemos fazer alguma coisa. Não sou eu que o digo, nem sequer o Nóvoa do rio triste, mas Chris McKay, cientista planetário da NASA que acha ser obrigação do homem ajudar os nossos vizinhos.
É provável que, com as temperaturas baixíssimas de Marte actual, haja formas de vida conservadas e viáveis, se tiradas desse frio. E, com a capacidade de colocar material industrial em Marte, o terráqueo—especialista, segundo se diz, em aquecer planetas—pode encher aquilo de gases com efeito estufa—dióxido de carbono, metano e rebabá—poluentes na Terra e medicinais em Marte (tudo é relativo—Einstein sempre!). Segundo McKay, é possível ao homem produzir condições para ter água no estado líquido em Marte dentro de 100 anos (menos que o tempo de vida de Manoel de Oliveira), processo chamado terraformar.
Não se trata de um Genesis não bíblico porque não há criação, apenas restauração, mas há problemas éticos um nadinha mais complicados que o facto de Cavaco não respeitar nem fazer respeitar a Constituição. Naturalmente que esses marcianos, putativamente por nós "ressuscitados", irão evoluir, de acordo com o darwinismo. E a pergunta é se será legítima a interferência dos terráqueos nessa evolução. Isto é, vamos deixar seguir o processo natural de tentativa e erro da selecção dos mais aptos, ou não vamos resistir à tentação de interferir na "engrenagem" para queimar etapas? A circunstância é quase tão complexa como a do Vara que levou à sua condenação a 5 anos na pildra.
Podíamos falar até ao fim do mês das trapalhadas éticas que tudo isto envolveria nos próximos milhões de anos, nomeadamente quanto às consequências, por exemplo, nas relações políticas com os marcianídios, com os marcianopitecos, com o marcianos acabados, quiçá com marcianos superiores ao Homo sapiens, mas se o leitor teve a caridade de chegar até aqui, não abuso. Muito obrigado pela sua atenção. Outro dia haverá mais marcianos.
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