sábado, 23 de março de 2013

'FIAT VOLUNTAS TUA'

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A acção divina, seja aplicada a montanhas, a marés, à consciência dos homens, não se enquadra na moldura da ciência. Ao dizê-lo, a ciência não está a negar essa acção—só não a compreende, porque cai fora do que sabe.
A ciência verifica que os fenómenos materiais ocorrem por causas identificadas que actuam por mecanismos próprios e meios conhecidos. Não pode afirmar que seja sempre assim, mas tudo quanto conseguiu perceber até hoje funciona dessa forma. Por isso, admite que o que ainda não percebe aconteça da mesma maneira.
A acção divina não cabe neste paradigma. Porquê? Porque não se conhece o seu mecanismo—existindo tal acção, e pode não existir sem que isso signifique negação do ser inteligente criador, não se vislumbra o mecanismo. É burrice do homem? Talvez, mas o homem não tem culpa de ser burro e está autorizado a pensar (um pouco de pensamento pra pensar até se perder no infinito..., como diria Vinicius).
A tempestade que rebenta no mar e faz perder dez vidas, a queda do menino em cima do monte de feno que lhe salva a vida, podem ser obras da acção divina? Podem, mas a ciência não entende como funcionam tais fenómenos; sobretudo porque são excepções às regras que observa na investigação. Caem fora da lógica do investigador. Usa Deus forças desconhecidas, transfere energia ignorada, modifica os circuitos eléctricos do nosso cérebro? É possível, mas não podemos pedir à ciência que admita isso—vai de encontro ao seu método de trabalhar.
Claro que há coisas pouco claras. Por exemplo, sabemos como o instrumento musical produz o som, como este se propaga no ar sob a forma de ondas longitudinais com comprimentos diferentes, como percute o tímpano, como se gera o impulso eléctrico que atinge o córtex cerebral, blá, blá, blá. Mas daí até perceber o efeito da música na actividade psíquica, em contraste com o discurso de Vítor Gaspar, vai enorme distância. Contudo, cientificamente temos de admitir que será por mecanismos já conhecidos noutros fenómenos.
Por isso, é mais fácil aceitar que, havendo um ser inteligente criador, as coisas foram organizadas à partida com regras imutáveis que a ciência conhece—ou vai conhecendo. Assim, quando a pressão sobe de mais dentro da panela fechada, esta rebenta. Pronto. É a vida, parafraseando Guterres. A acção divina no caso consistiu na aplicação duma lei termodinâmica criada no princípio do tempo. 
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