Ciência e religião têm tido momentos de atrito ao longo da História. Infelizmente, ainda hoje têm. Recordemos Galileu e essa lástima do Criacionismo na América actual.
De acordo com o "The American Heritage
Dictionary", religião é a crença num poder divino, super-humano, que deve
ser respeitado e obedecido, na condição de criador e regulador do universo. Ou,
segundo o "Dictionary.com", conjunto de crenças relacionadas com as
causas, natureza e finalidade do universo, sendo estas fruto de entidade super-humana
que exige habitualmente a observação de
rituais e um código de moral nos actos dos homens. Ora a ciência tem caído muitas
vezes em situações de conflito aparente, seja com a obediência e respeito ao,
ou pelo, poder divino, seja com a natureza ou finalidade do universo e por aí
fora.
A dificuldade de articular a ciência com a visão
fundamentalista da religião ou religiões é ilustrada pelo naturalista inglês
Philip Gosse, criacionista fiel como exigido no princípio do Século XVIII.
Grosse, ao encontrar fósseis de animais extintos muito antes dos 6.000 anos que
teria a Terra, caiu num impasse. Descalçou a bota decidindo que a Terra tinha
sido criada recentemente, mas incluía ossos e outros fósseis de animais que
nunca tinham existido, lá postos para mostrar que um universo como deve ser
inclui sinais de mudanças, mesmo que estas nunca tenham ocorrido. Profilacticamente,
mudou de ramo científico para não encontrar mais ossos de dinossauros que lhe
provocavam insónias.
Auspiciosamente, a ciência tem resistido a estas
ingenuidades e vai medrando, por vezes "merdando" também. Ninguém
contesta hoje a Teoria Heliocêntrica, nem a expansão do universo—espero eu.
Mas nem tudo são sombras científicas na história da
religião. Santo Agostinho, no Século V (!), escrevia assim: "Muitas vezes
o não cristão sabe coisas acerca da Terra, do Céu e outras partes do mundo,
sobre o movimento dos astros e suas órbitas, mesmo as suas dimensões e
distâncias, e tem certezas no seu conhecimento racional e experiência. É, por
isso, ofensivo para o não crente ouvir da parte do crente críticas sem senso,
nomeadamente com base na Escritura. Deve evitar-se tal situação embaraçosa, sob
pena de o não crente só ver ignorância e ridículo no cristão." (1)
E Santo Agostinho ia mais longe ao dizer que Deus tinha
introduzido intencionalmente mistérios ingénuos na Bíblia para dar ao homem o
prazer de os decifrar, referindo-se a passagens obscuras que exigem
interpretação metafórica.
A Bíblia foi escrita
em contexto histórico, social e cultural datado. Teria sempre de ser assim. Com
o avanço do conhecimento científico, tal facto levanta problemas aos crentes
difíceis de resolver. Não podem fazê-lo com os pés, com a fogueira, ou o
ostracismo—só com a inteligência que
faltou muitas vezes. Falta menos agora, mas continua a faltar por vezes. Com um
pouco de jeito, tolerância, menos arrogância e preconceito, vai lá.
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(1) Taylor, John
Hammond: The Literal Meaning of Genesis, Newman Press, 1982.
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