Preocupado com a abstenção, como manda o cliché e o primeiro-ministro? Estou mais preocupado com quem saiu de casa a um domingo para votar nos protagonistas do circo melancólico a que, por tique e desfastio, se apelidou de campanha. Criticar os abstencionistas é o mesmo que criticar o sujeito que, ante a possibilidade de gastar dez euros num péssimo filme ou trinta num restaurante atroz, preferiu improvisar uma omeleta e ficar-se pelas séries da Fox. Os antigos chamavam a isto bom senso. Com petulância, os contemporâneos chamam-lhe alheamento cívico, calamidade que se caracteriza pela recusa em apoiar voluntariamente a classe política que, queiramos ou não, já nos enxovalha a cada dia. Pelos vistos, não basta sermos tratados como mentecaptos: é preciso mostrarmo-nos agradecidos. Ou seria preciso, caso não fosse evidente que todos os que apelam à participação eleitoral são os que, indirectamente, vivem à respectiva custa. E directamente à nossa.
Alberto Gonçalves in "Diário de Notícias"
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