terça-feira, 3 de junho de 2014

SOMOS DANOS COLATERAIS



É instintivo pensar, mesmo entre profissionais da Medicina, que bactérias e outros seres microscópicos patogénicos evoluíram no sentido de serem capazes de infligir doença ao homem. Micro-organismo que causa doença ao homem seria seu inimigo.  A verdade é que isso é mentira, dizem os evolucionistas.
Se assim fosse, como se compreendia o comportamento de bactérias que levam à morte do hospedeiro, por exemplo, por meningite ou pneumonia?  Ao matá-lo, estavam a cavar a própria sepultura, destruindo o seu habitat. Não teria sido grande ideia terem evoluído de forma a adquirirem tal virulência, sendo esta sinónimo de capacidade agressiva.
O mundo microscópico é muito anterior ao macroscópico. Quando nasceu, ainda o homem e os seres ditos superiores, multicelulares, estavam no cu dos franceses. As guerras entre micróbios já existiam quando o mais remoto antepassado do Zezito ainda não tinha nascido. E tais guerras eram muito mais ferozes que as observadas entre o homem e os micróbios. Muita da virulência dos micro-organismos em relação ao homem foi adquirida nessas guerras entre eles, que se mantêm.
Por exemplo, o Streptococcus pneumoniae coabita,  nas nossas vias respiratórias superiores, com o  Hemophilus influenzae. Em princípio, nenhum deles está preocupado com o homem seu hospedeiro. Mas o H.influenzae tem o péssimo hábito de mobilizar os nossos glóbulos brancos contra o parceiro S. pneumoniae e este defende-se através de modificações da sua membrana envolvente. Acontece que isso lhe dá capacidade de avançar para partes mais profundas do aparelho respiratório, até aos pulmões, onde provoca a pneumonia. Na realidade, tal agressividade só surgiu em consequência das "provocações" do H.influenzae; caso contrário ele ficaria tranquilo a viver nas nossas fossas nasais, também conhecidas por ventas.
Exemplos semelhantes há às dúzias. Aliás, foi a guerra entre micróbios que permitiu a Fleming descobrir a penicilina, facto que mudou a Medicina—provavelmente—mais que tudo o resto descoberto antes e depois de Fleming. Este constatou, por acaso e porque tinha grande espírito de observação, que nas placas onde tinha semeado bactérias para cultivar e se esqueceu de tapar e meter na incubadora, as bactérias não cresceram em locais bem delimitados.  Estudando o fenómeno, chegou à conclusão que isso acontecia nos sítios onde se tinha instalado um fungo do género penicillium, produtor de substância que impedia as bactérias de se aproximarem—o que depois viria a chamar-se penicilina. Ainda o avô do hominídeo que viria a gerar os antepassados do homem chamado Fleming não tinha nascido e já os fungos andavam em guerra com as bactérias.
Serve isto para dizer que devemos compreender os micróbios que nos causam doença e, por vezes, nos matam. Não é crime premeditado. Tiveram na sua história momentos muito difíceis, sentiram necessidade de se preparar para a guerra, e nós—quando calha—somos o que agora se chama eufemisticamente danos colaterais dessas guerras. Só isso.
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