quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

HISTÓRIA DE PORTUGAL

[...] Ora não sendo o MFA à partida nem estruturado, nem politizado e permanecendo, à semelhança do que sempre foi a tradição dos militares portugueses, incapaz de governar, como foi possível deixar que o rumo da revolução passasse a ser ditado pelo PCP? Que interesses estavam em jogo e quem foi responsável por tal aventura, que ia atirando Portugal para uma terrível ditadura comunista?
O general Spínola em primeiro lugar. Não conhecia as pessoas que convidava e, aparentemente, tão-pouco conhecia os seus próprios colaboradores. A sua ignorância política e até o seu provincianismo, juntamente com a sua vaidade, impediram que a confiança depositada em si, de início, pelos capitães de Abril perdurasse. O seu primeiro erro foi estar ele próprio convencido de que lhe bastava a autoria do seu «best-seller», Portugal e o Futuro, para ocupar o lugar de Presidente da República. Depois, traindo os seus princípios de homem essencialmente reaccionário, que tinha participado na Guerra Civil de Espanha e no cerco nazi a Estalinegrado, aceitar que Álvaro Cunhal e o PC tivessem assento num governo de um País da NATO, na altura mais necessitado da ajuda económica e política dos seus aliados do que do reconhecimento diplomático dos países de Leste. Foi uma medida nunca aceite pelos parceiros de Portugal na NATO, que constituiu um perigoso precedente na Europa Ocidental e que nem os italianos, onde o PC era fortíssimo e mais democrático, alguma vez ousaram pôr em prática. A decisão de incluir comunistas no I Governo Provisório obrigaria, aliás, o então ministro dos Negócios Estrangeiros a desperdiçar as oportunidades que se ofereciam ao nosso país, usando todo o seu tempo para explicar a insólita decisão.
Esta medida iria custar caro ao general Spínola pouco tempo depois, quando «acordou» e tentou, num súbito golpe de autoritarismo, efectuar mudanças ao que previamente acordara com os «capitães de Abril», durante o que ficou conhecido por «crise Palma Carlos». Aí já não iria encontrar um único gesto de solidariedade internacional nem na Europa nem dos EUA, cujo regime ele afirmara ao embaixador americano querer copiar quando lhe transmitira pretender «implantar uma democracia de tipo ocidental, segundo as linhas existentes nos Estados Unidos da América».
[...]

Rui Mateus
“Contos Proibidos”, pag. 56 e 57

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