Seremos nós, hoje,
seres mutantes? Será que as transformações tecnológicas e culturais das últimas
décadas nas sociedades desenvolvidas são mudanças que apenas alteram, embora às
vezes muito substancialmente, as características, as rotinas e as expectativas
do ser humanos?
E acrescenta pouco depois:
Eu aposto na via da
mutação. Faço-o não por uma qualquer simpatia com a perspetiva da rutura, mas
porque me parece que se multiplicam os fatores de diferenciação e, sobretudo,
de não-retorno, que apontam nesse sentido.
E dá exemplos,
de que destaco:
Vive-se hoje quase mais um terço do que se
vivia há um século. Mas este dado objetivo, por si só absolutamente notável,
trouxe com ele mudanças subjetivas tão inéditas como extraordinárias em termos
de modo e de qualidade de vida.
Quase desapareceram os elementos que faziam
parte da experiência central e imemorial da humanidade, como a dor, a febre ou
o sofrimento, que deram lugar a um corpo que é vivido como uma garantia de bem
estar, que torna normal pensar alcançar a felicidade na terra, sem ter de se
esperar pela "outra" vida.
Viver muito, e bem, foi uma transformação que
mudou radicalmente a relação do indivíduo contemporâneo com o seu próprio
corpo, que passou a ser vivida de um modo mais positivo, nomeadamente
valorizando sem complexos todo o domínio dos sentimentos e das emoções.
Nada do que Carrilho
menciona corresponde a alteração estrutural significativa do Homo sapiens do Século XXI. Trata-se,
tão somente, de alterações comportamentais condicionadas pelo meio, através do
progresso tecnológico da Medicina, do avanço da organização social, da total
modificação dos meios de comunicação e por aí fora. Não há características
humanas novas que não possam ser explicadas pelo contexto social.
Se Carrilho chama
mutante a esse homem novo, escolheu mal o termo, porque não é. Não resulta de selecção natural de estirpes sob pressão do meio, mesmo se aceitarmos
o conceito de Lamarck da alteração do genotipo por influência desse meio. A selecção humana darwiniana leva muitos séculos, ou milénios.
É preciso cuidado com a terminologia para não estabelecer a confusão. Carrilho sabe isso. Ou devia saber.
É preciso cuidado com a terminologia para não estabelecer a confusão. Carrilho sabe isso. Ou devia saber.
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