[...] "Jorge Sampaio, no estilo críptico que desenvolve há
sessenta anos, ofendeu-se sobretudo com o desrespeito do sagrado Tribunal
Constitucional e pediu 'um assomo patriótico', o que quer que isso
seja. Mário Soares falou dos 'delinquentes' no poder e confessou
temer que 'o ódio do povo se torne violento', formulação que numa
cabeça matreira e pouco sofisticada significa que espera com impaciência a
sublevação das massas." [...]
[...] "O Governo é
mau? É, sim senhor, embora por não cortar onde devia e não pelos motivos que o
Dr. Soares e o Dr. Sampaio sugerem. O Governo é ilegítimo? Não é, não senhor,
excepto na opinião de criaturas como o Dr. Soares e o Dr. Sampaio, para quem a
legitimidade advém da coincidência entre os titulares dos cargos e as suas
simpatias pessoais. Simular preocupação com a 'pátria' ou o 'povo' para tentar impor as simpatias é estrategicamente
compreensível. Mas é também uma trapaça.
Não me lembro de
ouvir o Dr. Sampaio reclamar 'assomos' enquanto o Governo anterior
inscrevia a pátria na sopa dos pobres europeia. E sou capaz de jurar que,
nesses gloriosos tempos, nunca o Dr. Soares avisou para os riscos da plebe
indignada. A verdade é que ambas as alminhas citadas representam com brio o
ramo do pensamento filosófico lusitano segundo o qual a 'direita' (ou
o que em Portugal passa por direita) moralmente não merece mandar. Se o povo
real e bruto decidiu assim, há que imaginar um povo iluminado capaz de decidir
assado e correr com a 'direita' à bordoada.
Por enquanto,
trata-se apenas da imaginação de dois antigos presidentes da República,
felizmente para nós e, no fundo, felizmente para eles: nem sempre a fúria
popular pendura uma comenda no pescoço dos respectivos instigadores. Às vezes,
limita-se a uma corda." [...]
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Alberto Gonçalves in "Diário de Notícias"
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Alberto Gonçalves in "Diário de Notícias"
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