segunda-feira, 18 de novembro de 2013

OBSCURANTISMO

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Não entrei em ciclo de embirração com João César das Neves, de quem ainda ontem falei, mas o académico anda a bulir com os meus neurónios. Hoje é um artigo no "Diário de Notícias" que me causa prurido meníngeo. Não sou teólogo, nem pouco mais ou menos, mas há na peça trechos inesperados.
Começa assim:

"Não há felicidade maior do que saber que Deus, o Deus supremo, sublime, transcendente, que fez o céu e a terra, se entregou à morte para me salvar."

Isto é, o Deus, que é supremo, sublime, transcendente, fez um homem que só pôde ser salvo através da morte sangrenta, violenta e injusta de uma das suas pessoas. Convenhamos que, postas as coisas assim, é complicado entender. Como é complicado perceber porque o mesmo Deus—omnipotente e omnisciente—não tenha prevenido a necessidade de salvar de forma menos dramática o homem que criou; ou até a necessidade de o salvar.
Noutro ponto mais adiante escreve:

"Todos estamos condenados à morte e um dia, cedo ou tarde, a sentença será executada. Aliás, a morte não é só um justo castigo dos nossos males, mas também um alívio terapêutico dos mesmos males. Que seria viver para sempre em tanta maldade?"

Com o devido respeito pela substância em análise, o trecho parece-me mórbido. Filosoficamente, o pessimismo é inaceitável; humanamente, é cruel; sociologicamente, uma tragédia.
Aliás, todo o escrito é a partitura de uma sinfonia doentia e deprimente. Talvez João César das Neves tenha a convicção de estar a prestar um bom serviço à fé que professa. Engana-se. O texto é obscurantismo religioso no melhor estilo da Inquisição Medieval—em desacordo com a aparente linha do actual Papa. Difícil fazer pior.
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