domingo, 4 de maio de 2014

'NOBODY KNOWS MY SORROW'

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Darwin escreveu—em 1872, no livro "A Expressão das Emoções no Homem e nos Animais"—que a tristeza se expressa da mesma maneira em todas as culturas. Sendo a tristeza uma emoção tão generalizada, é legítimo admitir que há razões para ter sido poupada pela evolução. O lógico, numa análise superficial, seria ter sido eliminada pela selecção sexual em consequência da provável dificuldade dos tristes acasalarem. Mas não. Estudos antropológicos sugerem mesmo que têm charme!
Como pode um traço negativo, ou aparentemente negativo, constituir factor de atracção, "bem visto" pela selecção natural? Olhando à volta, constatamos que não é caso único. Por exemplo, a cauda do pavão, uma cangalhada imensa agarrada ao corpo, dificultando a mobilidade e tudo que isso envolve em termos de defesa, devia tê-lo liquidado há muito tempo. Ou as complicadas hastes do veado que, em termos de funcionalidade, não se afiguram muito inspiradas.
Para o biólogo israelita Amotz Zahavi, há nesta matéria um problema de custo/benefício. Em termos muito esquemáticos e excessivamente simplificados por falta de espaço, Zahavi defende mais ou menos que o pavão, o veado e o homem triste dizem ao mundo serem tão fortes que os seus genes podem suportar o handicap de arrastar uma cauda medonha, hastes que não lembram ao Diabo e uma personalidade assim sem que isso os afecte.
Há mesmo povos cuja cultura envolve muita tristeza. Embrulhada nos blues, viajou de África para o Novo Mundo, por exemplo; é exaltada na expressão japonesa 物の哀れliteralmente beleza das coisas tristes; e o famoso verso de Vinicius tristeza não tem fim é conhecido em todo o mundo letrado. Aliás, Claude Lévi-Strauss escreveu, em 1955, depois de uma viagem ao Brasil, um livro de sucesso chamado" Tristes Tropiques". Parece que tristeza é o que está a dar mais agora, vejam lá. Os portugueses podem estar satisfeitos por terem os políticos que têm.
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