João XXIII e João Paulo II foram canonizados no Domingo.
Hoje, Anselmo Borges escreve no DN sobre isso. Fica claro que Anselmo
Borges não concorda com canonizações—pelo menos da forma como são feitas. A
última frase do seu artigo é esta: Também nisto, estou com a minha irmã, que diz:
«Eu ligo pouco a estas coisas. Eu sou como o nosso pai que só rezava ao Nosso
Senhor».
Para ser franco, nunca percebi como apareceu esta coisa
de dizer, cá em baixo na terra, onde estão as almas dos que morreram. Quem tem
fé, verdadeira e inteligente, não acha uma petulância dizer-se ao mundo que é
ao Sumo Pontífice—usando palavras de Borges—que compete o direito de "decretar" se o
servo de Deus em causa merece ou não ser proposto como exemplo e modelo
para a devoção e imitação dos fiéis? O poder de "decretar" ou não
"decretar" a qualidade de santo de cada um parece pouco compatível
com a filosofia religiosa contida no cristianismo. Posso estar a ver mal mas,
depois de ler Borges, não me acho só.
A folhas tantas, Borges escreve esta coisa inesperada
para mim: "Foi por Celso Alcaina que soube do número de pessoas envolvidas numa
canonização: uns 24 funcionários permanentes na Congregação para as Causas dos
Santos, 14 advogados de defesa, 2 promotores da fé, 20 cardeais, 10 relatores,
228 postuladores adscritos, 70 consultores, muitos peritos em diferentes
assuntos, vários notários. Pode-se, pois, imaginar as somas de dinheiro que
esta parafernália burocrática custa, percebendo-se os perigos de discriminação
em que ficam homens e mulheres verdadeiramente santos, pois levaram uma vida
heróica, no cumprimento do dever e na entrega aos outros, mas que não têm
suporte financeiro, publicitário, político. Pergunto sempre: porque é que não
se canoniza o Padre Américo e tantos casais exemplares?" E, logo a seguir, cita o teólogo J. M.
Castillo: Num dos
estudos mais fiáveis que se fizeram mostra-se que «de 1938 casos examinados de
santos canonizados, 78% pertenceram à classe alta, 17% à classe média e só 5% à
classe baixa». Isto é—oficialmente,
digo eu—há mais ricos santos que pobres santos—embora Cristo achasse que
"é mais fácil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que entrar um
rico no reino de Deus".
A burocratização de qualquer religião é o pior que pode
acontecer-lhe. Temos por aí exemplos flagrantes e lamentáveis: a Cientologia, a
Igreja Universal do Reino de Deus e por aí fora. Em minha opinião, Cristo não as
aprovaria, embora não as "excomungasse", prática fora da sua
mensagem. Fico sem saber que diria Cristo sobre 78% de canonizações de ricos,
17% de gente da classe média e só 5% de pobres. Mais: gostava de saber o que pensava Cristo sobre as canonizações!
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