Perceber o universo, quaisquer que fossem os limites
observados, foi sempre aspiração do homem. As primeiras tentativas envolviam a
ideia de que os fenómenos naturais eram controlados por espíritos quase humanos,
com sentimentos e emoções volúveis, actuando de forma imprevisível e cruel que
era necessário aplacar para as colheitas serem férteis, ou para prevenir
tormentas que vitimavam populações inteiras.
Mas, gradualmente, o homem percebeu que o Sol nascia
sempre a Oriente e se punha a Ocidente, a Lua mantinha os mesmos ciclos ano
após ano e as estações sucediam-se com imutável regularidade, com preces e
sacrifícios ou sem preces e sacrifícios. Primeiro, o homem viu que havia leis
na Astronomia, e depois em muitos outros fenómenos naturais. Ou seja, os acontecimentos
eram regidos por regras, fosse qual fosse o seu autor. Assim pensou Laplace no princípio do Século XIX, o que o
levou a postular o determinismo científico, significando tal que as coisas
acontecem em resultado de leis pré-estabelecidas. Na realidade, o conceito de Laplace
teria que ser revisto mais tarde porque na Física Quântica, ao contrário da
clássica, de Newton, o determinismo não é assim tão claro e linear.
As religião, ou as religiões, sempre se mostraram avessas
a coisas como o determinismo científico, por porem em causa a importância da
intervenção divina. Mas a verdade é que não é incompatível com a criação
inteligente que terá posto em marcha um mecanismo que se move pelo próprio pé,
sem necessidade de assistência contínua.
O que acabo de escrever é uma síntese muito
"sintética" e próxima do que diz Stephen Hawking no livro " A Briefer
History of Time". Hawking seria porventura o mais ilustre físico quântico,
astrofísico e cosmologista actual do Reino Unido, se Peter Higgs não estivesse
ainda vivo. Tem tido opiniões filosóficas diferentes ao longo carreira. Aliás,
tem sobre os filósofos clássicos opinião própria. Diz a páginas tantas que no Século XVIII os
filósofos consideravam ser seu foro o conjunto do conhecimento, incluindo
discutir se o universo teve um princípio, como evoluiu, ou qual o seu
significado. Com o avanço da ciência, tais matérias tornaram-se demasiado
técnicas e matemáticas para eles—perderam o domínio do objecto. E cita Wittgenstein,
um dos mais famosos filósofos do Século XX, quando dizia que o único papel deixado
aos filósofos actuais é o da análise da linguagem. A tradição filosófica personalizada
por Aristóteles ou Kant finou-se.
Vem esta seca a propósito duma notícia hoje avançada no
"Diário de Notícias", de que Hawking fez uma conferência no Instituto
de Tecnologia da Califórnia, onde terá
dito que o universo não precisa de Deus para existir. É novo passo do físico no
seu pensamento filosófico: verifico que Hawking, de quem poderíamos dizer que
era—no máximo—agnóstico, virou ateu, posição respeitável e seguramente assumida
com convicção em pessoa como ele. Contudo, das notícias nos media nacionais e
estrangeiros, não fica claro como Hawking fundamenta o seu ponto de vista. Às
tantas terá dito que o Big Bang não precisou de Deus. É a resposta à questão
mais vezes posta pelo homem. Carece de justificação, especialmente vinda de
Hawking. No livro citado atrás, escreve assim: "Se descobrirmos um teoria
completa (sobre o universo), deve ser compreensível não só pelos cientistas.
Então, todos—filósofos, cientistas e público em geral—poderão tomar parte na
discussão do problema do porquê e como existimos, nós e o universo. A resposta
será o último triunfo do homem porque conheceremos a mente de Deus".
Por mim, ficaria encantado se pudesse ter a convicção que Hawking tem agora, assente em razão irrefutável. Hawking parece ter, mas não explica; ou os media
não explicam, embora fosse sua obrigação fazê-lo. Ficamos à espera de nova intervenção do físico.
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