A primeira e mais profunda divisão do trabalho ocorreu
por efeito do sexo. Não se sabe exactamente há quanto tempo, mas calcula-se que
tenha começado há mais de meio milhão de anos—os homens caçavam, as mulheres e
as crianças colhiam.
Ainda actualmente, na Venezuela, as mulheres hiwi andam a
pé para desenterrar raízes, extrair fécula da palmeira, apanhar legumes e colher
mel, enquanto os homens vão pescar e caçar. O mesmo fenómeno se observa no
Paraguai, na Tanzânia, na Gronelândia.
Não se trata do princípio de que o lugar da mulher é em
casa—nas sociedades caçadoras-recolectoras, muitas vezes a mulher trabalhava
mais que o homem. Tem a ver com os filhos e a necessidade de cuidar deles,
muito dependentes quando comparados com os filhos de outros animais. Com um bebé às costas e uma criança pequena a
arrastar-se atrás, é mais fácil desenterrar raízes e colher frutos que montar
armadilhas a antílopes ou veados.
Por outro lado, a divisão do trabalho era funcional. O
homem procurava as proteínas, a mulher os hidratos de carbono. Ele dispunha de
tempo para perseguir animais com tranquilidade, pois sabia que se não caçasse
haveria sempre uma refeição no abrigo; ela, em troca de trabalho mais
compatível com a assistência à prole, tinha garantidas as preciosas proteínas.
Recolher alimentos diferentes e partilhá-los, como faz o
homem, é prática que mais nenhuma espécie tem. De tal prática resultou o eclipse
da autossuficiência individual.
Provavelmente, terá começado aí o hábito das trocas. Depois veio a economia
colectiva, o dinheiro, as finanças, os impostos, a troika, o caçador-recolector
Vítor Gaspar, o Tribunal Constitucional, a sanha da perseguição aos jarretas reformados,
o abominável César das Neves e o Passos Coelho. Assim chegámos ao que
chegámos.
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