sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

O CAÇADOR-RECOLECTOR

.

A primeira e mais profunda divisão do trabalho ocorreu por efeito do sexo. Não se sabe exactamente há quanto tempo, mas calcula-se que tenha começado há mais de meio milhão de anos—os homens caçavam, as mulheres e as crianças colhiam.
Ainda actualmente, na Venezuela, as mulheres hiwi andam a pé para desenterrar raízes, extrair fécula da palmeira, apanhar legumes e colher mel, enquanto os homens vão pescar e caçar. O mesmo fenómeno se observa no Paraguai, na Tanzânia, na Gronelândia.
Não se trata do princípio de que o lugar da mulher é em casa—nas sociedades caçadoras-recolectoras, muitas vezes a mulher trabalhava mais que o homem. Tem a ver com os filhos e a necessidade de cuidar deles, muito dependentes quando comparados com os filhos de outros animais.  Com um bebé às costas e uma criança pequena a arrastar-se atrás, é mais fácil desenterrar raízes e colher frutos que montar armadilhas a antílopes ou veados.
Por outro lado, a divisão do trabalho era funcional. O homem procurava as proteínas, a mulher os hidratos de carbono. Ele dispunha de tempo para perseguir animais com tranquilidade, pois sabia que se não caçasse haveria sempre uma refeição no abrigo; ela, em troca de trabalho mais compatível com a assistência à prole, tinha garantidas as preciosas  proteínas.
Recolher alimentos diferentes e partilhá-los, como faz o homem, é prática que mais nenhuma espécie tem. De tal prática resultou o eclipse  da autossuficiência individual. Provavelmente, terá começado aí o hábito das trocas. Depois veio a economia colectiva, o dinheiro, as finanças, os impostos, a troika, o caçador-recolector Vítor Gaspar, o Tribunal Constitucional, a sanha da perseguição aos jarretas reformados, o abominável César das Neves e o Passos Coelho. Assim chegámos ao que chegámos.
.

Sem comentários:

Enviar um comentário