Imagine-se
a ouvir ou a ler que ontem um carro, em plena montanha, se dirigia para Norte—sem mais explicações.
A pergunta é: ia o carro a subir a montanha, ou a descer a montanha? É quase
certo que o leitor pensou no carro a subir e pensaria nele a descer, se fosse
para Sul.
Não
acredita? A experiência foi feita e quase nunca falha; isto é, Norte é para
cima e Sul é para baixo. É estúpido, mas é assim. Um australiano chamado
Stuart McArthur um dia perdeu a paciência
e propôs que os mapas fossem feitos ao contrário, com o hemisfério Sul em
cima, e consequentemente a Austrália também, e o hemisfério Norte
em baixo, com a a Europa e a América do Norte em baixo.
Estúpido
dir-se-á! Mas porquê? Porque os europeus e os americanos cairiam todos de
cabeça em direcção ao Norte? Posso sossegar os leitores porque já vivi dois anos
no hemisfério Sul e nunca caí. É um viés, como aquela coisa de dizer sem pensar
que um quilo da chumbo pesa mais que um quilo de algodão. Os mapas podiam
perfeitamente ser feitos assim e, à parte a trapalhada que era quebrar o
costume, era tudo igual.
As
palavras têm significados que lhes estão agarrados e nem sei se isso foi a
razão da sua génese. Por exemplo, dois "carros colidiram" não
desperta a mesma ideia que "dois carros esbarraram-se"—no primeiro
caso o choque não é muito forte e foi a baixa velocidade, e no segundo o choque
é mais forte e a velocidade maior, o que é uma burrice.
O
poeta alemão Christian Morgenstern disse um dia que todas as gaivotas
parecem chamar-se Ema. É subjectiva a afirmação, mas consubstancia a
teoria de que as palavras têm significados inesperados, não previstos nos
dicionários, tal como os nomes—uma Ana Luís, ou Margarida José que não
conhecemos, não são imaginadas como uma Dulce Maria, ou Cristina Isabel.
Tudo é convencional e relativo, ou seja, o costume é rei
de tudo, segundo o Poeta Píndaro que, não sei se já disse, não tive o prazer de
conhecer.
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